São Paulo, quinta-feira, 19 de maio de 1994
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O Milan renasceu das cinzas do Milan

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, o futebol prova pelo grande jogo do Milan de ontem o porquê é um esporte realmente extraordinário. E porquê é uma alegria acompanhar um jogo histórico.
Em primeiro lugar, porque o Milan que entrou jogando não era o Milan. E o Barcelona não era o Barcelona. Ou melhor, Fábio Capello foi mais Cruyff do que Fabio Capello.
Eis o que eu queria dizer: poucas vezes a equipe milanesa jogou, nesta temporada que se encerra, como jogou ontem. No ataque. Procurando o prazer do gol.
Com dez minutos de jogo, o Alberto Helena, da nossa equipe de juniores, me liga para dizer: o Capello mudou tudo, entrou para jogar mais ofensivamente.
Exato. Ele começou a ganhar o jogo no vestiário: para surpresa de todos, montou um Milan ofensivo, com praticamente três atacantes (Savicevic, Massaro e o apoio mais incisivo de Boban).
Foi um golpe inesperado e fatal nas prentensões de Cruyff –que esperava um jogo mais paciente, mais na cadência de toque de bola, com o Barcelona tomando a iniciativa permanente de jogo.
(A entrada de Beguiristan no time do Barcelona tinha este sentido: mas ela acabou sendo prejudicial porque desmontou a força tarefa que o meio-de-campo do Barça apresentava com Ivan).
Ao contrário, o Milan entrou para tomar a iniciativa da partida. Em um lance astuto, de grande estrategista, Capello preferiu o ataque ao contra-ataque –para o qual Cruyff se preparou o tempo todo.
A equipe milanesa –conhecedora da fragilidade da defesa inimiga– quis decidir logo. Contra as expectativas, os italianos chutaram dez bolas a gol no primeiro tempo (os espanhóis, apenas cinco).
O Milan entrou com o velho espírito implantado por Arrigo Sachi: com a paranóia da vitória. E exibindo as lições que ensinou nos últimos tempos: compactação, mobilidade, saída rápida de jogo.
Nenhuma sombra do Milan sonolento e retranquero que vimos em algumas partidas do campeonato italiano. Nenhum vestígio do Milan com a síndrome de pânico da comemoração dos gols.
Ontem o Milan deu uma aula de encher os olhos no renascimento do seu melhor futebol. Ontem o Milan cantou novamente aquela velha história de que a marcação não é incompatível com vontade de gol.
A esquadra Milanesa foi plena: imbatível nas quatro linha de defesa, exemplar nos médios, gana de ganhar no ataque. Desailly, mais solto, foi perfeito. O montenegrino Saviecevic, arrasador.
Com um time tão organizado taticamente, com um time com tão bons jogadores e com um poder de fogo tão grande, a pergunta que fica é: por que o Milan não joga sempre assim?
A goleada sofrida pelo Barcelona significa o fim das idéias de Cruyff para o futebol? Espero, sinceramente, que não.
Em primeiro lugar, só um time grande concebido por ele pode tomar uma goleada portentosa como esta. Porque ele corre o risco. Porque com quatro gols em uma final quem sai ganhando é o futebol.
Seria fácil montar um esquema com cinco defensores lá atrás, mais quatro marcadores no meio-de-campo e complicar a vida do Milan –como muitos pequenos times italianos complicaram.
E teríamos mais uma partida de um arrastado 0 a 0 (ou um modorrento um a zero, como no ano passado). Cruyff arrisca no ataque. Capello também resolveu arriscar. Deu no que deu: um jogo histórico.
O jogo de ontem mostrou que havia um gigante reprimido dentro do próprio Milan. Capello despertou-o e triunfou com o brado retumbante. Quem sabe lá na granja Comary um outro gigante não acorda....

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