São Paulo, sexta-feira, 20 de maio de 1994
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Os avanços de Lula

LUÍS NASSIF

Ainda existem lacunas significativas na visão de país e de economia, por parte do candidato petista à presidência, Luiz Inácio Lula da Silva. Mesmo assim, observam-se avanços no seu discurso e a consolidação de algumas idéias-força relevantes para a formação de expectativas dos agentes econômicos.
A primeira delas é que a economia tem de ter regras claras e estáveis de funcionamento, para poder estimular investidores. A segunda é que as regras têm que ser fixadas abertamente, dentro de um processo de negociação. Diz Lula que qualquer decisão acordada é mais eficaz do que meras imposições legais.
O modelo das câmaras setoriais –abandonado na gestão Fernando Henrique Cardoso– é visto por ele como prova concreta de que as questões econômicas devem ser tratadas entre si pela sociedade organizada (trabalhadores e empresários) deixando para a governo a responsabilidade pelo atendimento dos excluídos.
A partir da análise de microregiões, Lula começa também a dispor de uma visão mais moderna do papel do Estado na promoção do desenvolvimento econômico e social. Diz ele que o Estado deve se limitar a criar condições para que os setores econômicos se organizem e cresçam. Vale tanto para atividades empresariais como para a questão da habitação popular, onde sugere que o Estado limite-se a fornecer terrenos e facilitar o acesso a material de construção para que cada mutuário construa sua própria habitação.
Em relação aos fundos sociais, em entrevista ao "Jornal Gente", da rádio Bandeirantes, Lula declarou-se a favor de sua emancipação e entrega a uma gestão compartilhada entre empresários e trabalhadores. Mostrou-se francamente entusiasmado com o modelo de fundos de pensão, embora reconhecendo a necessidade de aprimorar a legislação para permitir um maior controle da gestão por parte dos associados. Também declarou-se a favor de entregar ações e controle das estatais ao FGTS –bandeira também abandonada pela gestão FHC.
Ainda falta a Lula uma melhor comprensão do processo de desenvolvimento, competitividade e emprego. Tanto, que ainda não conseguiu solucionar a seguinte equação: o que fazer se uma empresa necessitar de automação e de reduzir o efetivo de empregados, num primeiro momento, para voltar ser competitiva mais à frente? Mantém-se a empresa com o mesmo efetivo de trabalhadores, sem recuperar a eficiência? Ou aguarda-se que, com a automação, ela recupere o dinamismo e volte a gerar empregos mais adiante, em bases mais saudáveis?
A resposta de Lula é manter os empregos agora. Diz ele que o grande mal da Europa no momento é o excesso de automação gerando desemprego. Ignora a realidade palpável que, distorção ou não, esta é uma realidade concreta. E se a empresa brasileira não conseguir ser mais eficiente que a competidora internacional, perdem-se todos os postos de trabalho –não apenas aqueles decorrentes de uma restruturação competitiva.
Também continua com idéia fixa em controles de preços.
Lula não conseguiu superar a irritação com ex-presidentes de Banco Central e ex-ministros da Fazenda que passaram a trabalhar para credores estrangeiros. Mais ainda depois que soube que o ex-poderosíssimo Paulo Volcker, ex-presidente do FED (o BC norte-americano) sobrevive dando aulas na Universidade de Princenton.
A farsa dos aluguéis
A coluna recebe telefonema do jornalista José Roberto de Alencar, a propósito da afirmação de que Milton Dallari, assessor especial para preços do governo, teria aceitado o acordo contra os inquilinos por não ser especialista em contratos e não entender adequadamente conceitos como pico e média. Diz o Alencar: "Sou jornalista, nunca cuidei de preços no governo, sequer sou especialista em economia e sei perfeitamente o que quer dizer pico e média".
Tem razão. Foi montada uma farsa, com a participação ativa do assessor, que consistia em tentar conferir legitimidade a uma burla, trazendo para a negociação suposta represente de um associação de inquilinos sem sede social, estatutos, diretoria ou sócios. Então, o que lhe conferiu o direito de negociar o destino de milhões de inquilinos? "Ela telefonou se oferecendo", foi a resposta oferecida pelo assessor às indagações.
Só depois que, na segunda-feira, a coluna denunciou a farsa da primeira proposta –que implicava em conversões por 40% acima do pico– é que o assessor recuou. Mesmo assim, aceitou uma segunda proposta –que representava o reajuste pelo pico–, como se fosse uma concessão aos inquilinos e como se o fato de converter o valor de pico pelo aluguel pela URV do dia do efetivo pagamento representasse a média.
Não há justificativa para o que ocorreu, mesmo porque o conceito de média para aluguéis havia sido claramente colocada desde o começo pela equipe econômica.

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