São Paulo, domingo, 22 de maio de 1994
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Avenida vira `cabo-de-guerra' na cidade

VICTOR AGOSTINHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Modelo de urbanismo ultrapassado. Ruas estranguladas precisando ser expandidas. A relação de argumentos, favoráveis e contrários, se multiplica. O prolongamento da Faria Lima está longe de ser unanimidade.
Uma das críticas ao projeto do arquiteto Júlio Neves é o modelo de crescimento que ele está impondo à cidade através do desenho que vem sendo implantado na nova avenida.
"Uma obra ali só reforça o que já existe na cidade. Não gera novos mercados imobiliários. Não desenvolve outras regiões com potencial de crescimento", diz Raquel Rolnik, diretora de planejamento na gestão Luiza Erundina.
"Mas houve um crescimento brutal naquela região. Infelizmente o transporte público na cidade é frágil. As pessoas compraram carros demais. Não há nada mais natural que se amplie as avenidas naquele ponto", rebate Abram Szajman, presidente da Federação do Comércio.
Para o arquiteto Siegbert Zanettini, desapropriado e um dos líderes do movimento Vila Olímpia Viva, a Faria Lima está repetindo um erro.
"Desde 1930 se desenvolve um urbanismo onde se acredita que, ao resolver o viário, está resolvida a cidade. O fim é o homem, não o carro. É preciso investir em transporte público, em metrô, trens", afirma Zanettini.
"Todos sabem que o metrô sozinho não resolve o problema do transporte em parte nenhuma do mundo. É preciso, sim, haver integração com sistema viário para o ônibus acessar o metrô. Para isso, são necessárias as avenidas", diz Júlio Neves.
O crítico teatral Décio de Almeida Prado lembra que a abertura de uma avenida representa quase sempre um progresso para a cidade, "mas quando é efetuada em uma área densamente povoada, de nível econômico médio, parece excessivo o preço social que se deve pagar".
"Ninguém será prejudicado quanto à indenização. O conforto comum vale mais que o de cada cidadão", acredita o ex-governador Roberto Abreu Sodré.
Na opinião de Celso Lafer, ex-ministro das Relações Exteriores no governo Fernando Collor, "em matéria de políticas públicas deve haver escalas de prioridade. Fazer deste projeto o carro-chefe da administração municipal é não dar, até simbolicamente, a hierarquia dos problemas da cidade de São Paulo".
A priorização do prolongamento da Faria Lima é defendida por Júlio Neves, entre outros argumentos, pelo fato de que a obra vai ser auto-financiada. "Vai ter custo zero".
O presidente do Sindicato dos Arquitetos de São Paulo, Ives de Freitas, discorda de Neves: "Não é verdade que vai ter custo zero. Vamos lá, vamos imaginar que a obra da avenida seja zerada, mas a implantação da infra-estrutura de água, luz e telefone para atender os novos empreendimentos vai ter que ser paga pelo contribuinte, e isso custa caro".
Para o coordenador da Subcomissão de Meio Ambiente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Antonio Fernando Pinheiro Pedro, a "operação toda da Faria Lima nada mais é do que uma aventura imobiliária. Tenho a impressão que querem fazer uma enorme Luís Carlos Berrini ao redor dos Jardins".
(VA)

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