São Paulo, domingo, 22 de maio de 1994
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Nova droga para dormir não causa dependência

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ENVIADO ESPECIAL A BOSTON

\<FT:"MS Sans Serif",SN\>Álvaro Pereira Jr./Reprodução
Observações: COM SUB-RETRANCA
Nova droga para dormir não causa dependência
Lexotan, Dienpax, Rohypnol e outros remédios mundialmente usados para dormir podem estar com seus dias contados.
Uma pesquisa norte-americana em fase já avançada mostra que uma substância fabricada pelo próprio corpo, chamada melatonina, também é capaz de induzir sono –com grande eficácia e sem efeitos colaterais aparentes.
Um artigo científico ainda inédito, a ser publicado na conceituada revista médica britância "The Lancet", mostra que pequenas doses de melatonina causaram sono quando tomadas por pacientes jovens entre 18h e 20h.
"Os atuais sedativos só estão ainda no mercado porque não conhecemos o suficiente sobre fisiologia", diz a médica russa Irina Jdanova, que participou do estudo no Departamento de Cérebro e Ciências Cognitivas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, região de Boston, nordeste dos EUA).
Jdanova quer dizer o seguinte: em termos químicos, Lexotan, Dienpax e congêneres não têm nada a ver com os processos naturais que levam ao sono.
Eles funcionam por acaso. Porque acontece de suas moléculas se encaixarem nos lugares certos do sistema nervoso, combatendo a ansiedade e fazendo dormir.
E são usados porque se sabe muito pouco sobre os mecanismos de sono. Fica difícil, portanto, intervir "de fora" sobre os caprichos do corpo que nos levam a adormecer.
A melatonina, ao contrário, é uma das principais substâncias "suspeitas" de ter um papel crucial no sono. Ela é fabricada na glândula pineal (que é do tamanho de uma ervilha, fica no meio do cérebro e controla a relação do corpo com o ciclo dia-noite).
A quantidade de melatonina aumenta durante a noite e cai durante o dia. Crianças (que em geral dormem muito) têm muita melatonina. Velhos (que em geral dormem pouco) têm pouca.
Nada disso é definitivo mas, como se vê, são bastante fortes os indícios de que a melatonina tenha algo de muito importante a ver com o sono.
Essa pesquisa do MIT tem inúmeras consequências. Os sedativos do tipo Lexotan são os remédios mais vendidos nos Estados Unidos. É o futuro da indústria farmacêutica que está em jogo.
Um estudo da mesma equipe publicado em março provocou um terremoto na mídia norte-americana. Isso, apesar de aqueles resultados serem ainda preliminares e pouco conclusivos, porque se referiam aos efeitos da melatonina quando tomada no meio do dia.
A pesquisa está agora entrando em sua fase crucial. O artigo que sairá na "Lancet" falará sobre melatonina tomada à noite.
E um outro trabalho, já em curso, está medindo quanto dura o sono que a melatonina induz (porque não adiantaria nada ela fazer efeito, mas a pessoa ficar pouco tempo dormindo). Nesse caso, o voluntário no estudo toma um tablete de melatonina às 22h.
Segundo Jdanova, apesar das várias pistas de que a melatonina interfira no ciclo do sono, demorou algumas décadas para que seu efeito fosse comprovado.
Pelos estudos iniciais, esse tempo é de duas horas, mais do que com os sedativos comuns. Estes começam a fazer efeito em cerca de 15 minutos.
Os primeiros resultados mostram que a sensibilidade à melatonina varia de pessoa para pessoa. Em pelo menos um dos pacientes testados (sempre jovens e saudáveis), ela não teve efeito nenhum.
Mas isso não desencoraja os pesquisadores, porque o mesmo acontece com os sedativos "normais".

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