São Paulo, domingo, 22 de maio de 1994
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A hora da decisão

LEONEL BRIZOLA

Com a aproximação do prazo final das convenções partidárias e o sepultamento da manobra casuística com que se tentava ressuscitar José Sarney como candidato, estão se definindo as linhas sobre as quais se desenvolverão as eleições presidenciais de 3 de outubro.
Termina, agora, a época dos conchavos, das articulações dos políticos e começa a hora de o povo fazer o seu julgamento sobre os candidatos, suas trajetórias e aquilo que representam.
Mesmo as pesquisas, cujo caráter tantas vezes promocional nos dá o direito de encará-las com reservas, mostram-nos que, quando se trata de indicar, espontaneamente, sua intenção de voto, a maioria dos pesquisados manifesta sua indecisão.
Está, portanto, apenas começando o tempo das decisões e, antes de tomá-las, o povo brasileiro vai avaliar quem é quem nesta disputa.
Fernando Henrique Cardoso, não obstante seu passado de intelectual progressista, é hoje, sem qualquer dúvida, o candidato do "establishment", do governismo, da manutenção do "status quo".
O apego à notoriedade e aos salões do poder já há alguns anos dominam a mente e os atos de Cardoso, desde a sua tentativa notória de tornar-se ministro do governo Collor (o que seu partido, principalmente graças a Mario Covas, impediu) até seus últimos atos no governo Itamar, promovendo uma manipulação eleitoreira da economia, cópia do Plano Cavallo argentino, como o Cruzado de Sarney o foi do Austral de Alfonsin.
Habilitou-se, assim, a ser o candidato das classes dirigentes, daquelas que buscam, com estes remendos e arranjos, garantir a continuidade do modelo econômico, dos seus privilégios e da dominação colonial do país.
Como candidato, prosseguiu ainda com mais ênfase nesta espécie de vale-tudo e cooptou as oligarquias do PFL. O abraço da morte de Antonio Carlos Magalhães esta semana selou a absorção de Fernando Henrique pelo sistema, sepultou suas tintas progressistas e deixou claro para a população que é ele o candidato da não-mudança, aquele que, no governo, faria com que tudo permanecesse como está.
Já Lula é o típico candidato profissional. Desde o 2º turno das eleições presidenciais, tudo o que fez, durante quase cinco anos, foi se omitir de suas responsabilidades e visar, unicamente, sua atual candidatura.
Primeiro, desprezou e malbaratou aquela fantástica unidade das forças populares que se formou em 89. O PDT e eu chegamos, em nossa boa-fé, a propor formalmente uma união permanente, recusada por ele com alegações vagas e desculpas esfarrapadas.
Foi, então, candidatar-se ele próprio e ajudar seu partido a superar a conhecida rejeição ao petismo em São Paulo? A verdade é que Lula tremeu de medo tanto de uma derrota quanto de uma vitória que o levaria, no governo do Estado, a revelar sua inexperiência e o despreparo do PT.
Lula, tanto quanto FHC, jamais governou e agarra-se na mídia e nas concessões para buscar notoriedade e, no fundo, no mesmo programa neoliberal. No caso do petista, porém, os grandes meios de comunicação que o inflaram aguardam apenas o momento certo de esvaziá-lo e revelá-lo como um fraco e despreparado, para que, assim, vença o conservadorismo, como ocorreu em 89.
As denúncias de grevismo e sua fuga ao debate com Fernando Henrique foram apenas ensaios tímidos do vendaval que iremos assistir e que, outra vez, farão Lula e o PT vergarem-se como varas verdes e fracas que são.
Orestes Quércia, por sua vez, apresenta-se como representante de um PMDB dividido e debilitado. Uma candidatura de expressão no interior paulista e em alguns poucos bolsões de influência da sua estrutura partidária e pessoa.
É possível que apresente algum crescimento, em razão do peso daquelas estruturas, de sua atividade pessoal e dos recursos humanos e materiais de que dispõe. Mas, ao que tudo indica, enfrentará muitas limitações, em face das resistências e questionamentos que, como todos constatam, está enfrentando.
Quanto a mim e ao PDT, seguimos nosso caminho e nossos compromissos históricos. Há quase 50 anos, o trabalhismo vem sendo o repositório das esperanças de transformação da vida brasileira. Contra ele, fizeram 54, 61 e 64.
Ainda que fosse para cumprir simplesmente um dever partidário, não poderia eu recusar mesmo uma candidatura de simples participação. Mas, ao contrário, não é esta a perspectiva que se apresenta.
Tal como ocorreu no plebiscito do ano passado em favor do parlamentarismo, os políticos e as classes dirigentes já armaram o seu jogo. As pesquisas, da mesma forma, apresentavam o quadro como definido. Esqueceram-se, porém, do povo, do julgamento simples, mas lúcido, da população.
O povo brasileiro, contra tudo e contra todos, contra a mídia e os políticos (Lula, inclusive), foi capaz de se unir e mostrar sua força, derrotando aquela impostura e a todos eles.
Ali, foi um voto em defesa de seu direito de votar para mudar. Agora, é o próprio voto da mudança. É este o espírito que anima o nosso partido, a caminho de sua convenção nacional, no próximo sábado, no Anhembi, no coração de São Paulo.
E que Deus nos conceda a graça de estarmos à altura de sermos o instrumento firme e coerente das transformações profundas, das reformas de base que hão de tirar o país do atoleiro e abrir os caminhos de uma nova vida para o povo brasileiro.

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