São Paulo, terça-feira, 24 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Telas representam êxtase com a natureza

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Joan Mitchell entrava em transe diante de girassóis e árvores.
Mas seu êxtase no confronto com a natureza não lhe permitia realizar uma mera reprodução mimética do que via.
Mimetizava o processo, como se diante da tela se tornasse ela própria a criação do mundo.
O abstracionismo gestual de seus quadros é movido por vibrações e uma energia que a artista parecia tirar de uma imersão na natureza e passar em seguida ao espectador: a idéia de "se deixar levar pela correnteza" a que se refere o poeta John Ashbery quando comenta os trabalhos de Mitchell.
"As pinturas formam uma paisagem onde um ou mais elementos estão faltando ou distorcidos, (...) assim como violetas não são realmente pretas mas podiam ser. Quando olhamos para aquelas grandes pinturas dos anos 60, sentimos o gosto e o cheiro da umidade e da terra revolvida, piscamos diante de buracos de céu e cores fantasticamente impróprias para representá-lo, embora corretas dentro da pintura", diz.
Os quadros de Joan Mitchell tentam trabalhar com uma relação mágica em que uma abstração é capaz de reproduzir a energia de criação de uma paisagem, com cores e formas que não remetem a uma representação mimética.
O mais curioso é que, para definir essa relação singular, tenha-se recorrido com frequência a comparações com Van Gogh, por analogia de cores etc.
Dentro dessa perspectiva, as telas de Mitchell poderiam ser comparadas também ao trabalho de Cy Twombly (os rabiscos sobre o branco da tela etc.) com pinceladas que lembram as de De Kooning.
Mitchell foi casada por três anos (até 1952) com Barney Rosset, um dos mais prestigiosos editores independentes dos EUA, fundador da Grove Press. Em 1960, mudou-se definitivamente para a França com o pintor Jean-Paul Riopelle, onde tornou-se amiga de Samuel Beckett.
Além da Bienal de São Paulo, o trabalho de Mitchell será apresentado em outras mostras internacionais este ano. Durante o verão europeu, estão programadas uma exposição de pinturas no Jeu de Paume, em Paris, e uma retrospectiva no Musée des Beaux Arts, em Nantes (França).
No segundo semestre, simultaneamente à retrospectiva Cy Twombly no MoMA, a galeria Robert Miller, em Nova York, expõe pinturas da artista desde 1965.
"Em um ano e meio estaremos organizando uma grande retrospectiva da última década, uma exposição itinerante que começa no St. Louis Museum of Art e vai para Nova York e Chicago. Joan Mitchell criou um trabalho ao longo de quatro décadas. Entre os dez maiores abstracionistas do fim do século, ela vem no alto da lista", diz Miller.

Texto Anterior: Trabalhos de Joan Mitchell vêm à Bienal de São Paulo
Próximo Texto: Cabeça falante faz filosofia da miséria
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.