São Paulo, terça-feira, 24 de maio de 1994 |
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Aridez acadêmica marca estudo sobre Fellini
FEDERICO MENGOZI
É provável que o próprio cineasta, tão avesso ao cinema em geral e, principalmente, a interpretações sobre o cinema em geral, reagisse com igual espanto e ironia. Não falta seriedade ao estudo realizado pelo doutorando em Estética no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo. O estudo foi feito a partir de quatro filmes dos anos 70/80: "Roma", "Amarcord", "Ensaio de Orquestra" e "A Cidade das Mulheres". Infelizmente, o modo como expõe suas idéias –em "comuniquês"– não corresponde à alta fruição do cinema do mestre que se propõe desvendar. "Conflito e Interpretação" é árido como um filme de Fellini nunca é. Parte de uma hipótese fascinante –o diretor seria, como já disse Ettore Scola, o mais político dos cineastas italianos. Lança mão de todo um arsenal acadêmico, de Kant a Benjamin, e quase esquece de manifestar um raciocínio pessoal. É Fellini colocado na forma dos críticos da cultura de massa. Martins defende a impessoalidade do cinema de Fellini, em oposição aos que vêem nele o protótipo do cinema de autor. Vale-se até de certas declarações do diretor, segundo a qual a Rimini era uma completa ficção. Nega que fazia sobretudo um cinema de memória e que o cunho autobiográfico seja uma de suas marcas mais evidentes. Esquece-se que Fellini ousou o que não ousaram outros gigantes e icorporou o próprio nome ao título da obra. Mais pessoal impossível. A não ser que se colocasse do outro lado da câmara. E foi o que aconteceu em filmes como "Roma" e "Entrevista". E quando não se colocou do outro lado da câmara, filtrou toda uma vivência provinciana, como em "Amarcord". Negar o tom autobiográfico de cenas como a das crianças que admiram Saraghina na praia ("Oito e Meio") é negar os passos assentados de uma biografia –mesmo que de um mito. Ninguém duvida que o cinema felliniano é também político, principalmente na metáfora chamada "Ensaio de Orquestra". Mas é a política na dose exata de existências cotidianas. Discorde-se das premissas do autor e de suas licenças interpretativas, mas se reconheça a qualidade de suas afirmações e a pertinência de suas observações, embora dirigidas a poucos e raros. É pena que a retrospectiva que apóia o lançamento do livro –realizado ontem no MIS– não inclua nenhum dos títulos sobre os quais o autor se debruça. Título: Conflito e Interpretação em Fellini Autor: Luiz Renato Martins Preço: 9 URVs Texto Anterior: Autores se reúnem para relembrar movimento Próximo Texto: Filme traz imagens proibidas por Stálin Índice |
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