São Paulo, quarta-feira, 25 de maio de 1994
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Peregrinos muçulmanos morrem pisoteados

CHARLES RICHARDS
DO "THE INDEPENDENT"

Mais uma vez a romaria anual a Meca, conhecida como "haj", acabou em tragédia. Sabe-se que pelo menos 250 peregrinos morreram pisoteados durante um ritual de "apedrejamento do demônio" e há temores de que o número aumente.
As primeiras notícias da tragédia chegaram através de declaração do Ministério da Saúde da Arábia Saudita.
Um funcionário informou que 829 peregrinos morreram de velhice e problemas cardíacos no "haj" e que um número indeterminado foi morto por "grandes multidões atirando pedras, na segunda-feira".
A origem das vítimas não está clara. Em Ancara, um representante do governo disse que cinco mortos eram turcos. A rádio estatal argelina disse que havia pelo menos dois argelinos mortos. Um porta-voz do Ministério indonésio de Assuntos Religiosos disse que nenhuma das vítimas é da Indonésia.
Segundo o peregrino Talat Sharif, um grupo de indonésios estava andando lentamente quando "uma onda de pessoas, a maioria africanos altos e corpulentos, pisoteou-os até matá-los".
A "Reuter" citou diplomata asiático que estava na peregrinação: "Houve uma correria e debandada colossais. Vi pessoas apavoradas retornando da área, dizendo que várias pessoas haviam morrido e que não deveríamos ir para lá".
A correria e atropelamento ocorreram durante ritual de comemoração da tentação de Ibrahim (Abrãao) pelo demônio, quando este (na versão do Alcorão) tentou convencê-lo a não sacrificar seu filho Ismail (Ismael).
Os peregrinos atiram pedras contra três pilares em Mina, 10 km de Meca, para simbolizar o ato.
O desastre é negativo para os sauditas. Em primeiro lugar, enfraquece o título de Guardião dos Dois Lugares Sagrados que o rei Fahd se outorgou.
Ainda que gastem bilhões de dólares com sofisticados armamentos para defender seu reino contra ameaças externas, os sauditas se mostram incapazes de assegurar a segurança dos peregrinos.
Em segundo lugar, porque o modo pelo qual a notícia foi divulgada mostra uma atitude leviana.
E, em último, porque as autoridades não parecem haver feito qualquer tentativa de informar os países de origem das vítimas.
Até segunda-feira os sauditas se felicitavam por estarem administrando um "haj" sem problemas. Segundo as cifras oficiais, houve 1,5 milhão de peregrinos este ano, dos quais 1 milhão do exterior.
O "haj" é um dos cinco pilares do islamismo e cada muçulmano é exortado a fazer a romaria a Meca pelo menos uma vez em sua vida.
Ele também é motivo de grande preocupação para as autoridades da Arábia Saudita, um dos países menos hospitaleiros do mundo.
Pois o privilégio de abrigar os lugares sagrados do islamismo implica a responsabilidade de permitir o ingresso de centenas de milhares de pessoas.
A Arábia Saudita gastou bilhões de dólares para aumentar a segurança e tornar a romaria mais confortável. Também impôs cotas aos países muçulmanos, para limitar o número de peregrinos anuais e reduzir a superlotação.
Este ano houve confrontos entre os sauditas, que proíbem exploração do "haj" para fins políticos, e peregrinos iranianos, que utilizam a ocasião para manifestações contra o Grande Satanás (EUA).

Tradução de Clara Allain

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