São Paulo, quarta-feira, 25 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Atitude lamentável

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Não vi o programa em que o dr. Guilherme Romano revelou que possuía o "diário" de JK e o tinha lido, chegando a adiantar alguns pontos que ele, Romano, julgava quentes. Poucas vezes uma falta de ética foi tão explícita. O dr. Romano fora credenciado pela família a desembaraçar o corpo acidentado na Rio-São Paulo. Foi ele quem assinou o documento, na delegacia de Resende, declarando ter recebido os pertences da vítima, inclusive um portfólio com algumas páginas de anotações do próprio JK.
Ele recebeu esses pertences em nome da família. No entanto, antes de entregá-los a dona Sarah, tirou xerox das páginas deixadas por JK em seus últimos dias. Deu uma cópia a seu amigo e protetor, o general Golbery Couto e Silva –traindo assim a confiança da família e a memória do morto. E, agora, admite que ficou também com uma cópia. E pior: revela parte de seu conteúdo.
O diário de JK começou a ser escrito por volta de 1970. Ele fazia anotações em qualquer tipo de papel. De tempos em tempos, com sua secretária Elizabeth Ramos, dava texto final àquelas anotações, que eram então passadas à máquina. Em meados de 1976, ele ficou uma temporada em sua fazenda de Luziânia, onde continuou a registrar os pequenos fatos do dia-a-dia. Essas folhas estavam com ele, no dia 22 de agosto de 1976. Era um documento pessoal que somente ele poderia liberar. À falta dele, sua mulher e filhas.
Lamentável a falta de ética do dr. Romano. Traiu a confiança da família ficando com a cópia de um documento pessoal que não lhe pertencia e que só lhe chegou às mãos em momento e circunstância de morte.
E há pior: a versão que ele apresentou –segundo me contaram– é fantástica. Somente uma pessoa, ainda viva, poderá revelar o motivo da vinda de JK ao Rio naquela tarde: o professor Adriano Moreira, ex-ministro de Portugal, que tinha um almoço com ele no dia seguinte.
O suposto lance amoroso, levianamente revelado por Romano, era um caso antigo, em final de carreira. JK não viria ao Rio encontrar-se com quem –a um aceno– iria até ele onde estivesse.

Texto Anterior: Romário, soberbo
Próximo Texto: CALENDÁRIO DA COPA; LAVOISIER; NÃO VIU E NÃO GOSTOU
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.