São Paulo, quinta-feira, 26 de maio de 1994
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Mal acompanhado

Candidatos a vice-presidente costumam contar muito pouco em eleições, chegando frequentemente a passar em branco, desconhecidos do eleitorado, por toda a campanha. A experiência brasileira recente, no entanto, é contundente ao ressaltar a importância de que os nomes escolhidos como coadjuvantes nas chapas para o Planalto sejam levados em consideração no momento do voto. E, nesse sentido, o cenário que se descortina até agora não é nada animador quanto à eventualidade de o presidente escolhido não terminar seu mandato.
A escolha dos candidatos a vice no país de fato parece só acentuar o cálculo eleitoreiro que é igualmente a base de escolha dos titulares de cada chapa. Mais do que buscar um nome capaz de dar continuidade ao programa do titular no caso do impedimento temporário ou definitivo deste, as indicações buscam uma suposta capacidade de compensar eventuais deficiências eleitorais do cabeça de chapa.
Assim é que postulantes ao Planalto buscam companheiros de outros Estados, de outros partidos, de outro sexo, de outro grupo religioso –predicados que, por si só, ficam longe de assegurar um bom sucessor de presidente. É curioso, aliás, que essa lógica tenha ensejado o que pode ser considerado um avanço no país: a existência de duas mulheres candidatas a vice. Mesmo que a escolha deva-se em boa parte ao mero fato de serem mulheres, isso nunca ocorreu.
O pior de tudo é que a própria natureza do cargo de vice reduziu-o a mera moeda de barganha eleitoral. Afinal, a tendência natural é de que o vice atravesse seu mandato absolutamente inerte, o que torna o cargo bem pouco atraente. O problema é que, no caso de impedimento do titular, o país tem de enfrentar como seu mandatário máximo alguém que, na prática, não foi escolhido –e em geral não está preparado– para isso.
É algo como um diretor de cinema contratar uma grande estrela com a condição de, no caso de impedimento desta, substituí-la por uma figurante e não por outra protagonista à altura. A diferença é que o mundo do faz-de-conta jamais cometeria tal temeridade.

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