São Paulo, sexta-feira, 27 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Como vai o México?

CLAUDIO L. S. HADDAD

Pelo que se lê comumente na imprensa brasileira o México seria um exemplo de fracasso das chamadas políticas "neoliberais". Será isto verdade?
Em primeiro lugar, quanto à inflação e às contas públicas o sucesso do México é inegável. O país deve fechar o ano com 7% de inflação e desde 1990 o governo vem obtendo superávit operacional em suas contas. Uma recente reforma fiscal fez com que a arrecadação, que em termos relativos é semelhante à brasileira (27% do PIB), se tornasse muito mais justa e eficiente, mesmo porque inexiste o iníquo imposto inflacionário.
As críticas ao processo mexicano se concentram em três itens: 1) baixo crescimento econômico –alto desemprego; 2) taxa de câmbio sobrevalorizada e 3) o problema sócio-político.
De fato, embora o PIB mexicano venha crescendo nos últimos sete anos, o crescimento tem sido muito lento e a renda "per capita" encontra-se ainda em níveis próximos aos de 1982. Por trás deste fraco desempenho está uma taxa de poupança muito baixa (17% do PIB).
O ponto básico no entanto é que o México, assim como o Brasil, sofreu os efeitos do processo de abertura da economia, lá muito mais profundo e abrupto do que aqui e cuja resultante a curto prazo é o aumento do desemprego. Por mais doloroso que isto seja, tal processo não pode ser encarado como uma "fraqueza", mas sim como um passo inevitável para o fortalecimento da economia.
Antes que se tirem conclusões "definitivas" sobre a estagnação da economia mexicana deve-se tomar que: 1) vários setores produtivos estão sofrendo modernização profunda; 2) com o Nafta espera-se vultosos investimentos para os próximos anos; 3) a previdência social mexicana acaba de ser totalmente modificada, tendo sido criados fundos que, a exemplo do Chile, contarão com um montante enorme de recursos disponíveis para o financiamento do desenvolvimento. Por tudo isto, não vemos nada que impeça o México de voltar a crescer dentro de seu potencial histórico de 5% a 6% ao ano.
Está a taxa peso/dólar sobrevalorizada? O México tem tido de fato grandes déficits comerciais, mas isto tem acontecido junto a um substancial crescimento das exportações, apesar da queda de preços do petróleo. Em 1993, as exportações totais mexicanas alcançaram US$ 52 bilhões, das quais apenas 14% corresponderam a petróleo e derivados, contra 70% em 1982.
Quanto ao gigantesco déficit de US$ 23 bilhões em conta corrente a crítica é que, para financiá-lo, as taxas de juros teriam de ser elevadas. De fato, a taxa real de juros em pesos encontra-se em torno de 10% ao ano, alta, porém, uma "pechincha" quando comparada à nossa.
A expectativa das autoridades monetárias mexicanas é que, após as eleições (em agosto próximo), as desconfianças contra o peso diminuam e as taxas possam cair. Caso isto não aconteça a alternativa é: desvalorizar e baixar taxas com algum impacto inflacionário ou manter a paridade às custas de mais recessão.
Decisões como esta fazem parte do dia-a-dia das autoridades econômicas e não há nada que possa comprometer todo o processo de ajustamento. Cabe também notar que a dívida mexicana é em pesos paga no México, o que coloca este país numa situação relativamente confortável.
Quanto ao problema sócio-político, não há dúvida que o ajustamento da economia acarreta durante um período de tempo um agravamento do desemprego e de problemas sociais que podem levar ao extremo situações como a revolta de Chiapas. É isto prova de que o modelo mexicano faliu e de que outros Chiapas poderão acontecer?
Deve-se ressaltar que: 1) a eleição presidencial deste ano será provavelmente a primeira realmente livre da história do México; 2) o favorito no momento é o candidato do governo e quem hoje se encontra em segundo lugar nas pesquisas é tido como liberal de direita. Logo, não há, aparentemente, nenhum sentimento popular de grande rejeição ao "status quo".
Por outro lado, a opção pela via do acordo em Chiapas foi um importante passo para diluir o problema, bem como o aumento dos gastos sociais no orçamento. Em função disto tudo, não vejo como provável nenhum cenário de desestabilização política. Tudo indica que os problemas sociais serão tratados no âmbito das instituições vigentes, como acontece em qualquer país civilizado.
O que se conclui é que longe de ser um fracasso, o processo de ajustamento mexicano parece estar indo bem. Não somente é importante para todos nós analisarmos cuidadosamente, sem preconceitos, o que se passa lá, como também nos conscientizarmos de que o México é nosso competidor.
Quer a gente goste quer não, a lógica do mundo atual é a de concorrência, eficiência e produtividade. Não se trata de torcer contra o México, mas sim aprender com seu sucesso. Ao invés de falar mal dos outros, temos é que endireitar nossa própria casa antes que seja tarde demais.

Texto Anterior: Problema ignorado; Produção definida; Ganho reduzido; Prazo cumprido; No pasto; Marcha à ré; Ladeira acima; Preço da informação
Próximo Texto: Aviso prévio dever ser declarado no quadro três
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.