São Paulo, quarta-feira, 1 de junho de 1994
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MIS reúne filmes e desenhos de Glauber

EDUARDO SIMANTOB
DA REDAÇÃO

Evento: Glauber Rocha, um Leão ao Meio-Dia
Exposição de desenhos: a partir de hoje até dia 26, das 14h às 22h (de terça a domingo)
Mostra de filmes: de hoje a domingo
Onde: MIS (av. Europa, 158, tel. 280-0896, Jardins, zona oeste de São Paulo)
Entrada: franca

O MIS comemora os 30 anos da primeira exibição de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha (1939-1981), com um evento que reúne os filmes e uma exposição de desenhos do cineasta.
O único filme ausente na mostra do MIS é o curta-metragem "Di" (1977), interditado judicialmente para exibição a pedido da família do pintor Di Cavalcanti.
A exposição de desenhos, inédita em São Paulo, traz imagens produzidas a lápis, caneta esferográfica e hidrográfica, registrando esboços de roteiros que ilustravam suas anotações.
Glauber havia jogado no lixo a maior parte desses desenhos. Sua mãe, Lúcia Rocha, costumava recolhê-los e passava-os a ferro, arquivando a coleção.
Nos desenhos, destaca-se a preocupação de Glauber em estilizar arquétipos, como a figura de um santo ou de um Jesus na cruz, delineando os tipos mitológicos personalizados em seus filmes.
Com excessão de seu primeiro longa-metragem, "Barravento" (1961), Glauber jamais procurou compôr seus filmes de maneira realista. Os personagens que habitam sua obra são, numa primeira fase, personificações simbólicas que se chocam num universo agreste e atemporal.
Em "Deus e o Diabo na Terra do Sol" o universo mítico de Glauber Rocha se consolida. A perseguição ao cangaceiro Corisco (Othon Bastos) pelo matador Antonio das Mortes (Maurício do Valle) arma o pano de fundo para o drama do vaqueiro Manuel (Geraldo d'El Rey) e sua mulher, Rosa (Yoná Magalhães).
Um casal perplexo entre as promessas messiânicas do Santo Sebastião, reconstrução da figura de Antonio Conselheiro, e a opção de se juntar ao cangaço e lutar contra os fazendeiros.
Esse cenário seria retomado depois com "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro", no qual a figura de Antonio das Mortes, caçador de cangaceiros, torna-se a personagem principal.
Segundo o crítico Jean Claude Bernadet, a figura amoral e ambígua de Antonio das Mortes era a projeção da postura intelectual do cineasta.
Dividido entre as utopias políticas da esquerda à época, e ao mesmo tempo circulando e debatendo dentro de um restrito círculo intelectual, Glauber projetava-se no matador que chacinava os "campesinos" como única maneira de extirpar a miséria do sertão.
Mas pouco a pouco a desesperança começa a tomar conta da obra de Glauber. Em "Terra em Transe", o diretor transfere-se do sertão para Eldorado, republiqueta em plena efervescência política onde se debate o poeta/jornalista Paulo (Jardel Filho).
Esse delírio marca uma ruptura na obra do diretor. Já no fim dos anos 60, Glauber deixa de ver o cinema como o meio privilegiado de pregar a redenção social através de um êxtase estético.
A partir de então, Glauber volta-se para a desarmonia, distorcendo os planos e misturando sons e cores numa carnavalização dos mitos folclóricos e populares.
Durante a década de 70, Glauber quase não trabalhou no Brasil, filmando na Itália, Espanha e Cuba. É um período instável tanto em sua vida como em sua obra.
Sua morte, em 1981, logo após terminar "A Idade da Terra" foi, segundo Carlos Augusto Calil, "um alívio para todos, inclusive para Glauber, que não tinha mais como avançar sem recuar".

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