São Paulo, domingo, 5 de junho de 1994
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Lesão cerebral se complica em três fases

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Justin A. Zivin e Dennis M. Choi descrevem em }Scientific American o que se passa no cérebro atingido pela oclusão de um vaso sanguíneo, por exemplo um coágulo, e delineiam a sucessão, em parte hipotética, dos fenômenos moleculares que então ocorrem, e que podem servir de guia para o planejamento de drogas capazes de minorar as lesões.
Quando sobrevém a oclusão, as células nervosas (neurônios) mais próximas do foco e mais sensíveis morrem em decorrência da falta de oxigênio e glicose consequente à falta de sangue (isquemia).
Mas as células da região mais afastada podem sobreviver ao primeiro golpe, alimentadas pela circulação colateral. Nem por isso, todavia, escapam à possibilidade de degeneração e morte, porque são atacadas por substâncias nocivas excretadas pelos neurônios moribundos da região central.
Entre essas substâncias nocivas destaca-se o glutamato, neurotransmissor muito comum que inicia verdadeiras cascatas de reações químicas nas células atacadas, produzindo mais substâncias que mandam sinais de uma célula a outra (neurotransmissores) que afetam cada vez mais neurônios.
Os dois autores classificam em três tempos as alterações desenvolvidas por essas cascatas que começam a partir do glutamento.
Este ativa receptores de glutamato de vários tipos, um dos quais favorece a penetração dos íons de cálcio e sódio nas células.
Esses íons, por sua vez, ativam enzimas que aumentam a sensibilidade celular ao glutamato, criando estado de grande excitação. Assim se produz mais glutamato, que inicia outras cascatas químicas.
A última fase dos eventos é marcada pela degradação do DNA (a matéria-prima do gene), das proteínas e dos fosfolipídeos (gorduras com fósforo).
Estes originam o ácido araquidônico que destrói membranas, gera radicais livres de oxigênio, altamente tóxicos, e bloqueia vasos, propagando a isquemia. Radicais livres são conjuntos de átomos que têm afinidade por certos substratos e os corroem (oxidam).
A primeira providência terapêutica seria a remoção do coágulo por meio cirúrgico (o que só se pode fazer imediatamente após a oclusão) ou medicamentoso. Também se pode interferir na síntese do glutamato, por meio da sulfoximina, que em ratos brancos comprovadamente reduz a isquemia.
Outra providência é a ministração de drogas que estimulam receptores nos terminais dos neurônios. Também se pode interferir na síntese do glutamato por meio de drogas.
Mas o melhor meio para deter a cascata seria a ministração de antagonistas do glutamato. Existem vários compostos desse tipo experimentados em animais. Alguns estão sendo testados quanto à segurança em seres humanos, como o dextrorfan.
Quando a cadeia está no fim, poderiam entrar em ação drogas que interferissem na atividade dos radicais livres de oxigênio. Há vários inibidores desses radicais.
Alguns tratamentos poderiam ser úteis mesmo quando a lesão isquêmica se completasse ou estivesse próxima disso.
Os primeiros dias após o advento do ataque cerebral podem ser marcados por intenso esforço de regeneração por parte dos neurônios, assim como pela formação de novas conexões compensadoras em outros neurônios.
Algumas pesquisas revelam que tratamentos nesse período podem ser compensadores.
A ministração de anfetaminas (estimulantes da transmissão das catecolaminas) melhora muitas dessas deficiências em ratos.
Muitas propostas de intervenção feitas pelos autores ainda dependem de avaliação clínica.
Como a terapia é ainda em grande parte um propósito a atingir, torna-se muito importante prestar atenção redobrada aos fatores que concorrem para as lesões vasculares cerebrais, como hipertensão, diabetes, aterosclerose, doença cardíaca, fumo etc.
Em pacientes com história de mais de um episódio prenunciador de ataque cerebral, ou de acessos isquêmicos passageiros, a aspirina pode reduzir a incidência de ulterior acidente vascular. É o que recomendam os autores do artigo.

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