São Paulo, terça-feira, 7 de junho de 1994
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Pena de morte

Praticamente eliminada de toda a Europa Ocidental e também da maior parte da América do Sul, a pena de morte é hoje quase uma exclusividade de países de regime autoritário ou ainda a caminho da transição para a plena democracia. Paradoxalmente, uma das nações de maior tradição democrática do mundo, os Estados Unidos, não só mantém essa abjeta punição como também a aplica –e muito.
Como esta Folha revelou em sua edição de domingo num impressionante dossiê sobre a crueldade da pena capital, os EUA executaram, no ano passado, 38 pessoas. Há ainda 2.700 condenados nos chamados "corredores da morte".
É realmente chocante constatar que o país que ajudou a consolidar os ideais de liberdade e justiça no mundo contemporâneo ainda cometa esse tipo de violência, sobretudo quando se considera que há estatísticas que demonstram que a existência da pena de morte não tem impacto sobre a redução dos índices de criminalidade.
Uma contradição, porém, chama a atenção. Enquanto boa parte dos países que aplicam a sanção capital transformam as execuções em hediondas manifestações públicas procurando obter um suposto efeito pedagógico sobre a população, os EUA, até por serem um dos pilares das atuais noções de civilidade, não só levaram os assassinatos legais para o interior das prisões, como procuram formas de torná-los "mais humanos". E assim desenvolveram –com resultados mais do que discutíveis– as máquinas de morte contemporâneas, como a cadeira elétrica, a câmara de gás e, mais recentemente, a injeção letal.
Adotando esse procedimento, a Justiça americana admite a crueldade da pena capital e, ao ainda assim mantê-la, de alguma forma faz do Direito algo que lembra em muito a simples vingança, ou seja, a própria negação do Estado de Direito.
Mais paradoxal ainda, os EUA, devido às custas dos vários recursos cabíveis, chegam a gastar mais para condenar alguém à morte do que lhes custaria manter essa pessoa em reclusão perpétua. Fazem-no, é claro, para tentar evitar o erro judicial. Ocorre, porém, que essa possibilidade é inafastável. E é melhor que cem culpados escapem à punição do que um único inocente ser punido injustamente –e pior, de forma plenamente irremediável.

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