São Paulo, terça-feira, 7 de junho de 1994
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Esqueçam de mim

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Afastado do país havia duas semanas, mergulhei ontem nos jornais, buscando informações sobre a disputa presidencial. Pela leitura do noticiário, percebi que o ex-governador Antônio Carlos Magalhães está-se tornando o grande mago das eleições, distribuindo conselhos sobre como um candidato deve proceder. É curiosíssimo.
Curiosíssimo porque, afinal, Lula está bem na frente nas pesquisas na Bahia, onde nunca inaugurou uma mísera obra. E, por enquanto, vai mal Fernando Henrique Cardoso, sustentado por ACM, que, além de deter o controle dos principais veículos de comunicação, espalhou obras pelo Estado nos seus vários mandatos de governador.
Não há dúvida de que o ex-governador é popular: até porque foi generoso na distribuição de verbas publicitárias para se autopromover. Mas, se seus conselhos fossem tão valiosos, não teria perdido a eleição para prefeito de Salvador. Suspeito que, por ouvir demais ACM, Fernando Henrique não perceba estar entrando num processo de desmoralização.
Ao folhear as páginas dos jornais, vi cenas que beiram o ridículo, do tipo frases "tenho um pé na cozinha", apresentar-se como "mulato' ou desfilando, desengonçado, em cima de um mula. Nesse ritmo, vai acabar de lenço vermelho no pescoço, chapéu de palha, bigode artificial, camisa com remendo e dançando quadrilha.
Não dá para entender. Fernando Henrique Cardoso tem um dos melhores currículos brasileiros. Professor respeitado dentro e fora do país, foi uma das referências na luta pela volta da democracia. Teve uma boa passagem pelo Congresso, onde demonstrou sensibilidade social. Não se manchou como chanceler e ministro da Fazenda: em breve seu plano começará a exibir os efeitos positivos.
A essa altura de sua vida, não precisava buscar a imagem de animador de auditório –até porque corre o risco de não atrair novos votos e perder o respeito de seus eleitores.
Ele se irrita quando vê escrita declaração de que esquecessem o que escreveu. Mas, na prática, está fazendo algo pior: está pedindo para que esqueçam quem ele é.
PS – Será que os publicitários da campanha estão tentando vender FHC como se vende cerveja?

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