São Paulo, domingo, 12 de junho de 1994
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Ritho para a Bacante Cacilda ! ! !

JOSÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Ritho para a Bacante Cacilda!!!
Torço para que esta mulher baixe e vire com todas as exclamações este São Paulo agora acomado
Cacilda Becker em 1961 estourou o champanhe do Primeiro Teatro Oficina em construção, num arder de sol de tarde. No exato momento, uma estátua de São Jorge se espatifou.
As Línguas de Chamas do Dragão, as Fogosas Bacantes se libertaram das lanças do Guerreiro Cruzado, caído do cavalo com a couraça militar estraçalhada. Nasceu a faísca da Bigorna que um dia até incendiou este Teatro. Aí fomos guardados no seu ventre do Teatro Federação, na Brigadeiro: o Teatro Cacilda Becker, num Festival Retrospectivo.
"O Rei da Vela" acendeu outro incêndio no Segundo Oficina, nos anos do poder do culto ao deus da criação em que Cacilda era a chama votiva, o Poder Humano do Teatro.
O AI-5 quis apagar.
Pôs Cacilda e o Poder do Teatro em Coma.
25 anos de Maioridade deste Coma.
Saí de cena como ela quanto tentei ser consumido pelo Consumo em 90 minutos de espetáculo.
Fui pro hospital, como ela. Como Luís Antônio Martinez Corrêa, meu gêmeo de teatro, achava: "Vou morrer."
Luís sempre quis trazer minha saída do Coma.
Ele e Cacilda me visitaram no Hospital do Hades das Clínicas de Perséfone. Nós então fizemos um Pacto de Sorte no meio da Morte: eu escreveria o culto de cultivo, um rito para este Mitho, plantaria de novo o poder de Cacilda para outra primavera desta sua espécie Cacíldica, em extinção.
O Oficina foi demolido e reconstruído para o rito do segundo nascimento de Dionyzios, deus da criação, para "As Bacantes".
Mas agora estou achando que abriu mesmo para cultuar essa deusa da fertilidade teatral, a noiva de Dionyzios, Ariadne, a Bacante Cacilda de São Paulo dos Trópicos das Cabras.
A Bolsa de Dramaturgia de seis meses deu índices bovésicos para que eu levantasse o repertório, entrevistas, horas de bunda ao computador etc.
Mas essa certeza de ganhar vida dando outra vida para a espécie Cacíldica, escrevendo uma Ópera de Carnaval para Terreiro Eletrônico, um Ritho para este Mitho, me fez escrever a peça.
Eu precisava transdigitar todo o percurso da vida da Atriz, principalmente os dias até agora não revelados do Poder do Anarquista Coroado: o Ator, em 68. Daí vinha todo o vulcão no rabo! Despejei as larvas nas 900 páginas.
No último mês, quase um aborto. "Vai ter que nascer de cinco meses." Ordem da Secretaria de Cultura para este cultivo!
Nasce na marra a primeira "Cacilda!".
A dançarina dionisíaca, que o álbum cor de vinho de sua mãe Dona Alzira testemunhou, com a descrição de suas coreografias Xamânicas. Dança de Ariadne no primeiro ato & Imobilidade de Coma de 25 anos no segundo. Nascimento & Agonia & Morte Cômaca.
Mas as Cartas pro Corpo inseparável, Uno, Mitológico: as irmãs e a mãe me deram a outra Cacilda: "A Exclamativa em Dobro": "Cacilda!!" que ninguém conhece, nem ela, que dizia em entrevistas ter esquecido essa época de galinhosas loucuras. A Pré TBC. A Estrela. A Cometa Vagabunda, com fogo na Cauda! Todo um caminho que a seriedade da Fábrica do TBC não acolheu, essencial para o segundo nascimento de um Teatro Brasileiro Popular, Futebol, Revista, Novela, Carnaval, Chanchada e Algo Mais.
Principalmente Algo Mais.
A promessa dionisíaca de Infidelidade ao monoteísmo de um só Teatrão!
Mas a "Tri-Exclamativa" "Cacilda!!! Ah! Ah! Ah!", a da Fábrica Paulista de Teatro e Cinema Industrial. De Ritmo de São Paulo não pode parar! Ah! Haja fôlego! O Tédio da Recessão de Cada Dia de Hoje não aguenta: Days of Remake, Bossa Novelha, Tropifimdapica: Nada a Fazer. CDs. Espera eterna de Godot, Beckett nosso realista naturalista. Unanimidades, viva o Papa! Condenado ao êxito!
Mas antes da Parada teve o 68.
A Vontade de Poder em forma Humana de Atriz. Ah! Ah! Ah!
A atriz do Teatra Mundi!
Recebi em nove meses essa fábrica e escrevi uma coisa que não cabe no ventre estreito da infecunda São Paulo dos dias atuais: uma Overdose.
Esta Trilogia vai abrir só com a primeira parte?
Com uma só peça de Teatro?
Só?
É uma série de Teatro, TV e Filme.
Uma Longa Jornada no Labirinto da Ação Humana Total.
Minha esperança é que "Ela" baixe na linha de produção recessiva, peça de um, de dois, novela de propaganda de rico sem imaginação, ou de pobre burro, cineastas e estrelas sem filmes, livros só de Coelho e de "outras vidas"...
Cacilda! Caia como um raio de incorporação de macumba, um pinotte, um barravento, como a grande Comida exigindo ser Consumida nesta estação.
Me Comam!!! Ah! Ah! Ah!
Como o Fruto que no interior do Estado de São Paulo dá mais que laranja, cana, soja (Cacilda é de Pirassununga): o Fruto da Paixão, do que não pára, não pode parar, que chamam hoje de desequilibrium, ansiedade, fissura, histeria, sei lá que nomes?!!! Dêem o nome que quiserem, é o que aqui, mais que em qualquer outro lugar do mundo, dá e cresce. Pra exportação! Mas entrou há alguns anos em Catatônica Coma.
Vamos fazer um Modesto, um "real" plano de Produção, à altura da falta de Gosto Atual?
Equilibrado?
Sem fissura de Consumo Voluptuoso?
Sem Mania de Qualidade Rigorosa?
Não sei.
Mas aposto, torço para que esta mulher baixe e vire com todas as exclamações este São Paulo agora acomado, vagão que nem puxa, nem é puxado.
Assim como a estagnação, o ócio da produção paulista fez de mim o Bode "O decano do ócio", ela entrou em mim e me fez uma trilogia de quase mil páginas.
Ela é a Força de produção desta cidade, for export para o país e para o mundo.
Que foi parar aonde?
No Túmulo do Cemitério do Araçá? Nela?
Em todos as Feias Paulistas Adormecidas? No ouriço de mentirinha dos Jardins congestionados?
Preparem-se pois a roda pode girar de novo.
Cuidado de novo ao atravessar a rua.
São Paulo pode, vai, disPARAR.
DisPARAR!!!
Sirenes:
Cacilda!!!
Ah! Ah! Ah!
Pulmões!!! Corações!!!! Pavios!!!
Méeeeeeeeeeeeeee!!!

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