São Paulo, quarta-feira, 22 de junho de 1994
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Leia a íntegra do pronunciamento do ministro da Fazenda

Leia a seguir a íntegra do pronunciamento do ministro da Fazenda, Rubens Ricupero:
Boa tarde. Ontem foi um dia de grande alegria para o nosso povo, que bem merecia esses instantes de vibração, depois da tristeza da morte de Ayrton Senna e de outras frustrações. Hoje porém, recomeçamos este caminho de preparação do real.
Havia até trazido um texto escrito para falar sobre preços, mas resolvi dar um caráter mais informal a esta conversa. Estou até me afastando do meu texto para dizer alguma coisa que vá direto ao coração do homem brasileiro, que se preocupa com o que lê nos jornais.
Hoje em dia, todos os jornais falam da aceleração dos preços e que a inflação está aumentando. Até um certo ponto é o mesmo fenômeno que ocorreu em fins de fevereiro, um pouco antes a entrada da URV, depois em abril estes preços se desaceleraram. Na verdade é injustificável este movimento, é injustificável porque a indústria e o comércio tiveram quatro meses para se prepararem e, estamos vendo que, novamente, se aproximando o prazo da entrada em circulação da nova moeda, todo mundo se precipita.
É um pouco como o Imposto de Renda que as pessoas, infelizmente, deixam sempre para o último momento. É uma pena que isso ocorra. Temos que lamentar profundamente que tenha havido esta falta de responsabilidade de alguns setores, por uma razão muito simples: qual era a finalidade principal da URV? Era dar tempo para que durante quatro meses os preços fossem se alinhando, uns em relação aos outros, isto é, para que não pudessem dizer, como aconteceu em planos anteriores, que o problema foi que alguns preços haviam tido reajustes, enquanto que outros não tiveram tempo e se criou um desequilíbrio. POrtanto, demos quatro meses mas, infelizmente, vemos que não foi suficiente.
Qual seria a solução para este caso? No passado os senhores sabem, tentamos várias vezes o tabelamento, o congelamento de preços e não deu certo. Todos os nossos planos falharam no momento de sair do congelamento. Então, preferimos apostar desta vez na liberdade de mercado, preferimos apostar na democracia, na negociação livre entre as partes.
Ora, a democracia tem um custo e o custo é esse que estamos pagando atualmente com esta precipitação dos últimos dias. O governo lamenta que isto ocorra, mas ao mesmo tempo, queria dizer a todos, porque é preciso ter isto bem claro, que na verdade estes aumentos vão se traduzir também no seu aumento de salário pela URV no fim do mês de junho.
Vocês sabem que a URV, além do primeiro objetivo que era o alinhamento dos preços, tinha também este objetivo maior, que era permitir ao seu salário acompanhar dia-a-dia a inflação, e para isso a URV se corrige, não pela inflação de meses passados, ela se corrige com o câmbio, com o dólar dia-a-dia. Portanto, os aumentos embora lamentáveis, embora muitas vezes injustificáveis, não vão prejudicar o seu poder de compra porque você vai receber no fim do mês, no seu salário, o suficiente para continuar a comprar.
Como se pode fazer para evitar que no futuro este problema volte a ocorrer? Existem sempre dois extremos nesta matéria: aqueles que ingenuamente pensam que tudo se resolve com fiscalização, com tabelamento, com proibições e com punições e aqueles que ficam no outro limite em que dizem –temos que dar absoluta liberdade de mercado, só a competição é que resolve. Na verdade nenhuma destas posições é a correta, precisamos ter vigilância, precisamos coibir os abusos e ao mesmo tempo precisamos confiar na concorrência, com uma grande força para termos os preços baixos e estáveis.
O que se pode fazer a este respeito? Há muita coisa que o Governo pode fazer e que você cidadão também pode. Do ponto de vista do Governo, o que o Governo Federal já fez? em primeiro lugar ele, junto com o Congresso, deu ao Brasil uma lei adequada, uma lei para proteger a concorrência que o Congresso acaba de aprovar e que vai permitir coibir qualquer abuso em termo de preços, qualquer tentativa de empresas que formam cartéis que formam grupos para impor um determinado preço. Isto é importante, existe nos Estados Unidos, na Alemanha e na França e vai existir entre nós.
Além disso o Governo Federal está tomando contato com todos os governadores de Estado e com os prefeitos para que eles se mobilizem, todos tenham o Procon, que é a procuradoria do consumidor. Todos possam vigiar, possam saber quais são os preços que estão sendo aumentados abusivamente; e estamos procurando estimular também as entidades de consumidores para se mobilizarem.
Ao mesmo tempo que fazemos isto no domínio da lei, no domínio da repressão ou abuso, estamos criando condições para a competição. De que forma? Em primeiro lugar estimulando uma oferta abundante de produtos. Uma das maneiras de fazer isso é através da importação.
Uma grande diferença entre este plano atual e o Plano Cruzado, por exemplo, é que naquela época, em 1985, o Brasil tinha uma economia fechada, não se importava nada, até goiabada que provavelmente só é produzida no Brasil, tinha um imposto de 105%. Imagine qual era o país que poderia competir conosco nesse domínio!
Hoje em dia isto mudou, os impostos de importação são baixos e estamos procurando ainda rebaixá-los. Acabei de assinar na semana passada uma nova medida, diminuindo para zero e para 2%, os impostos sobre produtos de limpeza, higiene pessoal, fraldas de bebê, material de construção, a própria carne.
Sempre que se faz isto, há gente que diz que não vai adiantar, não vai haver importação. Não acredite nisto, telespectador, essas opiniões são sempre dadas no sentido interesseiro. Vou lhe dar um exemplo: bastou que na semana passada chegasse ao porto de Paranaguá o primeiro navio com arroz do Vietnã para que, dois dias depois, o arroz que estava subindo no Rio Grande do Sul, sem justificativa (era no meio da safra), começasse a cair, portanto os senhores vêem que quando se permite a competição os preços baixam e o mesmo vai acontecer com o estímulo à competição dentro do nosso país.
Queria mostrar a vocês uma notícia que saiu na imprensa de sexta-feira: "Vendas caem e frustram os supermercados". O que diz aqui é que os supermercados tiveram neste primeiro semestre uma queda entre sete e quinze por cento, porque o consumidor se retraiu depois do aumento abusivo de preços que houve em fins de fevereiro e que está havendo agora. Os senhores vêem portanto que a concorrência está produzindo efeitos e quem abusar vai acabar quebrando. Estão querendo levar para o real a inflação que acabou com o valor do cruzeiro e do dinheiro que havia antes, mas nós brasileiros não vamos permitir que isto aconteça.
Temos ordens claras do Presidente Itamar Franco para aplicar com todo o rigor a nossa lei contra os abusos. Vai ser muito mais fácil conseguir evitar estes aumentos se o consumidor tomar cuidado nestes dias que antecedem a chegada do real. A queda da inflação não depende só do Governo, dependem muito de você consumidor. Por isso é muito importante que nestes dias você compare preços, preços de marcas diferentes do mesmo produto, preços de lojas diferentes, entre supermercados e outras lojas.
É preciso que você leia nos jornais as listas que alguns Governos de Estado vão publicar, daqueles supermercados, daquelas lojas com preços mais baratos. Dê conselhos aos seus parentes e seus amigos, não se precipite em comprar, espere, sobretudo nas vendas de prestação, você pode perder muito já que a inflação vai cair. Evite aceitar qualquer arredondamento em centavos de URV ou em centavos de real porque o real vai valer muito.
O sucesso do real depende de todos nós. Ontem à tarde, tivemos a alegria de ver como todo o povo brasileiro foi capaz de confiar no país, de confiar em nós mesmos, de ter aquele orgulho de ser brasileiro. Então, vamos confiar neste plano, vamos confiar no real e vamos contribuir para que realmente a inflação desapareça e criar um novo país.
Muito obrigado e boa tarde.

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