São Paulo, sexta-feira, 24 de junho de 1994
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Kathleen Turner desperdiça seu talento

LEON CAKOFF
ESPECIAL PARA A FOLHA

Filme: O Enigma das Cartas
Produção: EUA/Itália, 1993
Direção: Michael Lessac
Elenco: Kathleen Turner, Tommy Lee Jones, Asha Menina
Cines: Espaço Banco Nacional de Cinema/sala 1, Lumière

Como magnata das telecomunicações italianas e produtor de cinema, Silvio Berlusconi também resolveu investir na produções de filmes "made in Hollywood". O nome de Silvio Berlusconi aparece como produtor de "O Enigma das Cartas", filme americano de capital italiano que esconde as suas origens.
Com um filme falado em inglês e elenco americano, Berlusconi revela ser mais um adepto do conceito de que assim os filmes são mais rentáveis. Considerando a crise crônica de identidade em que o cinema italiano está mergulhado, este filme passa a ser um exemplo explícito de atitude politicamente incorreta, sendo impossível deixar de associá-la com a figura de um Berlusconi agora investido da função de primeiro-ministro da Itália.
Um cinema com vergonha de ser italiano, com locações na Carolina do Norte e em ruínas maias do México, confiado a um diretor estreante que envolveu Kahtleen Turner "por velha amizade", indeciso entre misticismo "high- tech" e metodologia psicológica.
Por mais que dissimule suas origens, o filme não consegue apagar a impressão mais forte que ainda marca o processo decadente do cinema italiano: o de imitar outros sucessos. No caso, de "Rain Man" e outras apelações.
Kathleen Turner faz a viúva arquiteta que não aceita o diagnóstico médico que insiste em tratamento clínico à sua filha com sintomas de autismo. A menina passa a gostar das alturas desde que ouve de um guia turístico mexicano que o seu pai passou a morar na Lua depois de morto. Começa subindo no telhado da casa e termina escalando um prédio projetado pela mãe.
O melhor do filme está na torre de cartas de baralho e de tarô que a filha monta e a mãe reproduz no computador com realismo virtual. Mas é bom e dura pouco. Mãe e filha passam a se entender graças a toda a tecnologia e aparato eletrônico e arquitetônico existentes, o que coroa o filme com outra evidência politicamente incorreta, ao menos no Primeiro Mundo: de que a cura é um privilégio dos ricos.
Uma eternidade parece separar a Kathleen Turner do místico "Enigma das Cartas" da sua provocante estréia em "Corpos Ardentes", há treze anos. A estreante Kathleen parecia uma promissora reencarnação das divas do "film-noir". Ela continuou seguindo o modelo polivalente e andrógino de Lauren Bacall. Depois de filmar com Lawrence Kasdan, passou pelas direções de John Huston, Francis Ford Coppola e do italiano Peter del Monte.
Berlusconi conseguiu fazer um grande estrago na sua carreira.

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