São Paulo, segunda-feira, 27 de junho de 1994
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A DJ jamaicana enfrenta machismo e tem seu disco de estréia, 'Queen Of The Pack', lançado no Brasil

SÉRGIO MARTINS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando se conhece a fundo o esquema "mato seis, traço dez" dos machistas DJs jamaicanos (como são chamados os rappers locais), é de se espantar a proeza de Patra.
A DJ de 19 anos, coloca seu disco de estréia, "Queen Of The Pack" (lançado no Brasil pela Sony), em primeiro lugar na parada de reggae da "Billboard".
O mais curioso é que ela aborda em suas músicas o mesmo tema sexista de Shabba Ranks e Bujo Banton –um defensor da matança de gays.
Como em "Worker Man", onde a DJ prega que "um homem não é um homem se ele não der duro na cama".
Patra batalha desde os 15 anos e foi descoberta por Clifton "Speciallist" Dillon –que também trabalha com Shabba–, o produtor de "Queen".
O ápice da carreira da DJ será no início de agosto, quando ela se apresenta no Reggae Sunsplash Festival, o maior do gênero, que acontece todo o ano na Jamaica.
Em entrevista exclusiva para a Folha, por telefone, de Nova York, Patra como é enfrentar o machismo dos DJs jamaicanos.

Folha - Você já ganhou o título de rainha do dancehall e "Madonna Negra". Qual deles você prefere?
Patra - Não me lembro de ser comparada a Madonna. Quanto ao título de rainha do dancehall é bem diferente de ser a rainha da Inglaterra ou de outro país.
Na verdade não ligo para títulos: prefiro ser conhecida como uma artista negra que deseja mostrar seu talento e divertir as pessoas.
Folha - Muitas mulheres –inclusive você– na Jamaica estão desafiando o machismo local e tornando-se DJs. Qual a sua opinião a respeito dessa "virada"?
Patra - Os homens não podem ser os patrões de Patra. Não aceito que digam o que tenho de fazer. O reggae vem crescendo, não só na Jamaica, e estão aparecendo mulheres com talento.
Folha - Além de você, quais são as outras DJs com condições de tentar uma carreira internacional?
Patra - Bem, essa é uma pergunta difícil de responder. Falam muito de Lady Saw (outra DJ que peita o machismo no dancehall), mas o estilo dela ainda é preso ao gueto.
Meu trabalho é dirigido para uma carreira internacional, mostrando que canto, faço rap e tenho uma produção de nível.
Folha - Em que você se inspira ao escrever as letras de suas músicas –muitas delas são cheias de duplo sentido?
Patra - Eu procuro escrever o que sinto. Se me sentir sexy hoje, escrevo uma letra sobre sexo. Se compuser uma música onde eu tenha que cantar, canto sem problemas. Depende da sensação, da "vibe" do momento.
Folha - Em "Queen Of The Pack" há várias músicas –como "Think (About It)"– com mensagens sobre a Aids. Esse é um problema que você enfrenta no dia-a-dia?
Patra - Como Shabba Ranks, Buju Banton e Mad Cobra pregavam o "sexo seguro" para as mulheres, eu senti que deveria falar sobre isso aos homens.
Meu CD atinge vários tipos de pessoas, dos amantes aos mais pobres e acho importante passar esse aviso.
Folha - Qual a sua relação com Shabba Ranks? Você tem um dueto com ele em "It's A Family Affair" (tema de "A Família Adams 2").
Patra - Shabba é como um pai para mim. Foi uma das pessoas que deram apoio à minha carreira e sempre me encoraja.
Shabba não acredita nas minhas letras, no meu estilo de rap. Às vezes ele fica rindo e fala: "Patra, você é maluca!" (risos).
Folha - As letras de Shabba Ranks são bem sexistas. As mulheres não ficam envergonhadas em ouvir a música dos DJs?
Patra - Para mim, as letras dele não são perigosas. Sexo é uma coisa que todos fazem e não vejo sentido em proibi-las. Escrevo sobre a sensação gostosa desse ato. Prefiro sexo a violência.
Folha - Com o tipo de letra que você canta, dá para ser considerada um símbolo sexual do dancehall?
Patra - Bem, eu procuro não falar de mim: prefiro ouvir a opinião das pessoas que compram meus discos e vêem meus shows. Se depender delas, sou o novo símbolo sexual da Jamaica. Minhas músicas levam os homens à loucura.

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