São Paulo, terça-feira, 28 de junho de 1994
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Cariocas

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO – Romário, o matador, é carioca do subúrbio, nasceu na favela e foi criado na Vila da Penha, antes de, literalmente, ganhar o mundo.
Na melhor entrevista feita com ele até agora –domingo, no caderno Copa 94–, mostrou que é inteligente e safo também fora de campo.
Disse coisas que em geral jogador de futebol não diz. Mais: disse o que cariocas em geral pensam e têm receio de dizer.
Refiro-me às suas declarações sobre traficantes: "Não fui ajudado por traficantes. Sou contra as drogas. Mas, por outro lado, acho que cada um tem a sua cabeça pra ir no seu caminho. O cara é meu amigo. Se ele é traficante ou drogado, eu vou continuar falando com ele. Só não vai na minha casa. Mas respeito todo mundo."
Esta certamente é a posição da maioria dos cariocas que são obrigados a conviver com o tráfico. Sim, o tráfico que domina as dezenas de morros, que manda nas esquinas, que constitui o poder paralelo nesta cidade que padece da ausência crônica do poder público.
Viva e deixe viver, é a lição que Romário aprendeu no Jacarezinho –é, Jacarezinho da música de Jorge Ben, que também faz alusão a drogas– e carrega consigo como algo que não se esquece. Para continuar a viver.
Quem é mais culpado, Romário, ao ter coragem de assumir tranquilamente este seu comportamento em princípio condenável, ou a polícia, totalmente incapaz de combater o tráfico?
A culpa é de todos, da sociedade tolerante e amedrontada, que permite a suas feridas crescerem celeremente.

Quando se diz que o Rio é uma cidade de contrastes e exageros, esta afirmação é que soa como um exagero.
Mas veja o caso da família Lavouras, dona de uma empresa de ônibus na Baixada Fluminense. No último sábado, o patriarca da família foi sequestrado pela terceira vez. Sim, três vezes. Isto depois de um outro integrante da família ter sido sequestrado e morto em 93. Triste recorde.

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