São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 1994
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Dois filmes que fizeram sua mãe chorar

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Não é só a personagem de Cassia Kiss em "Fera Ferida" que se desmancha toda quando se lembra do filme "Tarde Demais Para Esquecer" (An Affair To Remember). Muitas outras quarentonas (e cinquentonas) também consideram a comédia romântica de Leo McCarey, estrelada por Deborah Kerr e Cary Grant, o máximo. "É o `Casablanca' dos anos 50", proclama a cineasta Nora Ephron, que há pouco lhe prestou em "Sintonia de Amor" a mais reverente e explícita das homenagens.
Seu lançamento em vídeo, no Brasil, coincide com a chegada às locadoras de outro filme idolatrado pelas moçoilas de 30 anos atrás: "O Candelabro Italiano" (Rome Adventure). Isto mesmo: aquele passeio turístico de Suzanne Pleshette pela terra da fonte dos desejos e da princesa e o plebeu. Exato: com Troy Donahue e o indefectível Rossano Brazzi. Ao fundo, "Al Di La".
São dois títulos "de rigueur" em qualquer videoteca cor-de-rosa que se preza. Apesar de alguns pontos em comum –e um deles é a presença de Delmer Daves, diretor de "O Candelabro Italiano", como co-roteirista de "Tarde Demais Para Esquecer"–, a comédia de McCarey só perde a disputa no quesito paisagem.
Enquanto Cary Grant e Deborah Kerr atravessam o Atlântico encerrados num navio, visitam uma Ville-Franche (sul da França) fajutada nos estúdios da Fox e circulam por alguns poucos trechos de Manhattan, Suzanne Pleshette e Troy Donahue cruzam fartamente a Itália a bordo de uma lambreta: Roma, lago Albano, Ostia Antica, Arezzo, Florença, Pisa (claro, que eles se beijam na torre inclinada), Orvietto, lago Maggiore, Veneza, Verona (claro que eles visitam a sacada de Romeu e Julieta). Ao fundo, "Al Di La".
Produzida em 1962, a prototelenovela de Daves é fruto de uma safra de "love affairs" sexualmente reprimidos, cujo modelo, "Amores Clandestinos" (A Summer Place), também trazia a assinatura do cineasta, além do mesmo galã, Donahue, o Tom Cruise da era Kennedy. O fino para as mocinhas de então ainda era ir à Europa atrás de cultura e um príncipe encantado. A Itália gozava de maior prestigio que Paris e em suas três cidades mais visitadas (Roma, Veneza e Florença) várias virgindades quase foram pro brejo.
Quase. A de Prudence Bell resistiu firme até o casamento. Prudence é a professorinha encarnada por Suzanne Pleshette. Quando a vemos pela primeira vez, ela está se demitindo de uma escola por causa da censura que seus diretores impuseram ao livro que prega a libertação da mulher pelo amor. De preferência em Roma –para onde ela embarca, deixando um ambiente tão mesquinho quanto o de "A Caldeira do Diabo".
Fazendo jus a seu nome, ela se entrega sem largar a rédea. O candelabro do título é um artefato metafórico que, a despeito de sua forma fálica, simboliza a integridade da moça. É uma espécie de cinto de castidade que Don (Donahue) acata com uma naturalidade descabidamente idiota aos olhos de hoje. Ao fundo, "Al Di La".
Outras metáforas e alusões eufêmicas substituem o sexo no "tour" amoroso de Prudence e Don. A lambreta vira um leito motorizado, o passeio num teleférico é um orgasmo e uma conversa sobre cócegas nos lábios nos leva a desconfiar que os dois estão falando de tesão de forma oblíqua. Tendo ao fundo, naturalmente, "Al Di La".

Vídeo: O Candelabro Italiano
Direção: Delmer Daves
Lançamento: Warner (tel. 011/820-6777)

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