São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 1994
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Grant e Kerr protagonizam pacto amoroso

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Ao deixar o porto de Nova York, a professorinha de "O Candelabro Italiano" avista a estátua da Liberdade e lhe dirige um gesto de despedida descaradamente irônico. É outra metáfora do filme. Mas o que interessa aqui não é o seu significado, mas a semelhança dessa cena com outra, bem mais famosa, de "Tarde Demais Para Esquecer". Também passada num navio. E no mesmo local.
Com pequenas diferenças. Ao contrário da professorinha de "O Candelabro Italiano", Nick Ferrante (Cary Grant) e Terry McKay (Deborah Kerr), os pombinhos de "Tarde Demais Para Esquecer", estão voltando da Europa. Nenhum deles se fixa na estátua da Liberdade, e sim no Empire State Building, que em 1957, quando o filme foi rodado, ainda era o prédio mais alto da cidade. Ou, como diz Terry, "a coisa mais perto do céu que nós temos na cidade".
Enquanto a professorinha vai atrás da "verdadeira" liberdade, Nick e Terry marcam um encontro no céu para dali a seis meses. É um dos pactos amorosos mais célebres do cinema. Se ainda estiverem apaixonados um pelo outro, ambos subirão até o 102º andar do Empire State, às 17h do dia 1º de julho de 1957. E de lá sairão direto para comprar as alianças.
Mas nada disso acontece. Se acontecesse, "Tarde Demais Para Esquecer" perderia seu encanto. No dia do tal encontro, Terry, apressada para chegar logo ao Empire State, é atropelada e fica paralítica. Nick, crente que levou um voluntário bolo, recolhe-se ao seu casulo e tenta esquecê-la. Até que um dia, em pleno Natal, os dois se reencontram, ele descobre o que aconteceu –e tudo termina como num conto de fadas. Também com uma canção ao fundo, "An Affair to Remember", que apesar de lançada por Vic Damone fez sucesso com Nat King Cole.
Com uma dupla de atores absolutamente irresistível, um roteiro impecável e diálogos saborosíssimos, "Tarde Demais Para Esquecer" não mexeu apenas com os corações femininos. Os marmanjos do "Cahiers du Cinema" também adoraram o filme, lançado na França com o título de "Elle et Lui". Nele vislumbraram "um delicado jogo de arabescos" inacessível às platéias rombudas –ou meramente desabituadas às sutilezas do cinema americano dos anos 30, a primitiva fonte do inesquecível caso de Nick e Terry.
Ao rever a primeira versão, "Duas Vidas" (Love Affair), também escrita e dirigida por Leo McCarey em 1938, com Charles Boyer e Irene Dunne nos papéis de Grant e Kerr, constatei que "Tarde Demais Para Esquecer" tem mais 28 minutos de projeção. Não dá para notar. Salvo por alterações mínimas (Boyer é francês e se chama Michel Marnay, em vez de uma cigarreira ele perde um telegrama, o casarão da avó fica na ilha da Madeira, mas até o cão dela é da mesma raça do segundo), as duas versões são idênticas.
Diálogos, enquadramentos, achados de "mise en scène" –quase tudo que há de melhor em "Tarde Demais Para Esquecer" já havia em "Duas Vidas". Mas, cá entre nós, que os setentões não nos ouçam: Cary Grant e Deborah Kerr tinham mais charme que Charles Boyer e Irene Dunne. (Sérgio Augusto)

Vídeo: Tarde Demais Para Esquecer
Direção: Leo MacCarey
Lançamento: Abril Vídeo (tel. 011/832-1555

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