São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 1994
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Blakemore redesenha mundo com suas fotos

DANIELA ROCHA
DA REDAÇÃO

Exposição: Rituais Íntimos: As Paisagens Biográficas de John Blakemore 1971 a 1991
Quando: abertura hoje, às 20h; até 31 de julho, de ter. a dom., das 14h às 22h
Onde: MIS (av. Europa, 158, Jardins, tel. 011/280-0896)
Entrada: franca

Paisagens da natureza e tulipas são os temas do trabalho do fotógrafo inglês John Blakemore, 57, que serão mostrados na exposição "Rituais Íntimos: As Paisagens Biográficas de John Blakemore 1971 a 1991", a partir de hoje, no Museu da Imagem e do Som.
Blakemore viria ao Brasil para fazer um "workshop", mas está trabalhando em casa para finalizar seu livro –um ensaio sobre tulipas– que deve ser lançado em dezembro.
Professor de fotografia, Blakemore começou na área em 1956, quando acreditava que poderia provocar mudanças sociais com a fotografia.
No final dos anos 60, em viagens ao País de Gales, descobriu a afinidade com a paisagem. Em entrevista por telefone à Folha de sua casa, em Derby (Inglaterra), Blakemore comenta seu trabalho e sua relação com a pintura.

Folha - A exposição de suas fotos no Brasil mostra duas fases diferentes. Uma em que a temática é a paisagem, e outra com a série das tulipas. Atualmente em que você tem trabalhado?
Blakemore - Estou ainda trabalhando com as tulipas, preparando um livro que devo publicar em dezembro, então resolvi me dedicar apenas a isso no momento.
Folha - Na sua infância, em Conventry (Inglaterra), o sr. costumava desenhar os cavalos que o fascinavam.
O sr. desenha também as fotos que pretende tirar?
Blakemore - Quando penso em uma foto, costumo desenhá-la em minha imaginação. Assim, eu tenho desenhado em minha cabeça muitos aspectos do mundo.
Quanto ao ato de desenhar, tenho feito seriamente no dia-a-dia. É uma atividade que requer muita habilidade. É difícil desenhar um pássaro ou qualquer outro elemento da natureza da maneira como o enxergamos ou imaginamos.
Folha - Os campos são amplamente retratados em pinturas inglesas do século 19. O sr. acha que a paisagem é uma referência cultural britânica?
Blakemore - Não tenho certeza se existe tal engajamento entre a referência cultural britânica atual e a arte. Não sei se podemos vincular as duas coisas dessa maneira.
Talvez essa relação esteja mudando porque está muito mais comercial. Agora o que existe é muito mais recriação do que já foi feito do que a proposta de uma mudança propriamente dita. Mas nem todos concordam com esse posicionamento.
Folha - O fotógrafo americano Ansel Adams influenciou o seu trabalho de alguma maneira?
Blakemore - Não, eu apenas admiro-o. Não tenho interesse na conquista do ambiente selvagem. Vejo meu trabalho como uma referência de minha relação pessoal com a natureza, minha investigação sobre o ambiente de determinados lugares.
Isso aparentemente é um paradoxo, porque procuro uma ligação com o ambiente. A diferença é que o meu trabalho é feito em diferentes espaços sem que eu os idenfifique nas fotos.
Folha - O sr. costumava fechar os olhos e ouvir os sons do ambiente que ia fotografar. Por quê?
Blakemore - Porque era uma maneira de ficar em sintonia com os lugares que iria fotografar. Sempre trabalho sozinho e dessa forma ficava mais envolvido com a natureza.
Folha - Mesmo em seu trabalho mais recente, a série das tulipas, que é feita em jardins, o sr. também está sempre sozinho?
Blakemore - Sim. Trabalho por conta própria. Preciso de concentração. Se hovesse alguém trabalhando comigo, essa pessoa teria de ser paciente. Mas ainda assim existe o risco de perder a concentração no que estava fazendo.
Folha - O sr. é professor de fotografia?
Blakemore - Sou professor na Universidade de Derby, e meu curso associa a fotografia a vários fenômenos naturais, nos termos histórico e cultural.
Folha - Algumas de suas fotos das tulipas parecem pinturas surrealistas. O sr. concorda?
Blakemore -Sim, concordo de certa forma. Em fotos das paisagens, a pintura de Samuel Palmer e de William Blake influenciaram muito o meu trabalho, por explorarem de uma forma especial a fantasia do ambiente. Tenho uma ligação com os impressionistas, mas não me diria impressionista.
Folha - Como é a sua rotina?
Blakemore - Como professor, tenho que trabalhar intensamente na universidade. Atualmente faço meu trabalho fotográfico em casa e continuo desenvolvendo fotos com tulipas. É um trabalho demorado, é um processo.
É por isso que gosto de fotografar um mesmo lugar ou objeto por um longo período de tempo: o trabalho se torna um tipo de entretenimento, e você se torna familiar ao objeto fotografado.
Folha - Por que a tulipa foi eleita o objeto de seu trabalho?
Blakemore - Faço a celebração das tulipas porque quero mostrar a beleza que têm. Sigo o processo, a maneira como a tulipa se torna pesada, o que é mais do que simplesmente encontrar uma relação com a morte.
Folha - Suas fotos de paisagens e das tulipas têm técnicas e estilos bem diferentes. Existe relação entre elas?
Blakemore - Sim, existe uma inter-relação grande, só que antes, nas fotos de paisagens, eu tinha outras preocupações, como o tempo, a luz, o vento.
Com as tulipas, me concentro apenas na flor. São trabalhos diferentes, mas a idéia é similar. Na verdade, quando comecei o trabalho com as tulipas, pensava que fosse completamente diferente, mas percebi em pouco tempo que eram trabalhos conectados.

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