São Paulo, quinta-feira, 7 de julho de 1994
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Erros demais

"Sempre que vejo um erro de impressão, penso que algo de novo foi inventado."
Goethe

O autor de "Fausto" foi profético. Como esta Folha revelou em sua edição de ontem, um dos vários erros de digitação encontrados nas emendas ao Orçamento Geral da União preparadas pelo Prodasen transformou uma verba de US$ 522 mil em US$ 10,8 bilhões, ou seja, foi capaz de multiplicar um gasto estatal por pouco mais de 20 mil. Ou bem o Brasil inventou uma fórmula de multiplicação dos dólares, uma verdejante pedra filosofal, ou então descobriu uma nova e ousada forma de fazer pouco-caso do dinheiro e da paciência públicos.
É claro que erros se encontram por todos os lados. Mesmo a contabilidade da mais eficiente e informatizada empresa privada do mundo pode exibir algumas discrepâncias devido a falhas de digitação.
Mas, quando esses erros se multiplicam da forma que ocorre no material elaborado pelo Prodasen, fica a suspeita de extrema incompetência ou de fraude. Não é difícil imaginar o destino de um funcionário de empresa particular que, ao digitar valores contábeis, sistematicamente acrescentasse alguns zeros antes da primeira casa decimal.
Mesmo que se considere que todos os números serão cotejados com o original de apresentação de emenda e que os equívocos poderão ser corrigidos, em meio a tantos erros (das 25 emendas apresentadas por um único senador, em 14 havia falhas), a possibilidade de ocorrer uma fraude ou um gasto indevido aumenta brutalmente.
É óbvio que não se pode, de chofre, suspeitar de todos os que participaram da elaboração do documento. É preciso distinguir os erros honestos daqueles perpetrados por homúnculos unicamente preocupados em ver crescer seus próprios rendimentos à custa de mais e mais miséria para a população.
De qualquer forma, o mínimo que se exige do poder público é um pouco mais de atenção e rigor na manipulação do dinheiro do contribuinte. É preciso que o funcionalismo se dê conta de que o Erário não é um fundo sem dono do qual os mais espertos podem dispor livremente, mas sim um dinheiro que deve reverter em benefícios para a nossa tão sofrida população. E se essa mentalidade não for redescoberta, aí sim o Brasil terá inventado algo único na história da humanidade: o erro absoluto.

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