São Paulo, quinta-feira, 7 de julho de 1994
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O que é de fato real

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Era previsível e, talvez, inevitável. A discussão em torno do real, como quase tudo no Brasil, tem um horizonte de curtíssimo prazo, além de estar profundamente impregnada de eleitoralismo.
A pergunta que parece subjacente é se o real sobrevive ou não até as eleições. Dá até a sensação de que, de alguma forma, o Brasil se acaba no dia 3 de outubro ou 15 de novembro.
Feliz ou infelizmente, o Brasil continuará a existir no dia 4 de outubro, 16 de novembro e 1º de janeiro (posse do novo presidente). Seus problemas estarão do mesmo tamanho.
O real, mesmo que seja muito bem-sucedido, nem sequer tangencia as três questões que, simplificando um pouco, são as realmente essenciais, a saber: a reconstrução do Estado brasileiro, a recuperação de sua infra-estrutura devastada e, acima de tudo, pelo menos o início do resgate da dívida social.
O governo alardeou um suposto equilíbrio fiscal como mola propulsora do real, ao lado dos limites para emissão de moeda. Perfeito, do ponto de vista apenas das contas públicas. Mas, primeiro, não há como se falar a sério em equilíbrio fiscal quando o país nem sequer tem Orçamento aprovado para 1994, embora já tenha transcorrido exatamente a metade dele.
Segundo: só se poderia falar honestamente de equilíbrio fiscal se ele existisse também quando o governo estivesse recuperando a infra-estrutura e atacando a sério a área social. Para que isso possa de fato ocorrer é que se necessita reconstruir o Estado brasileiro.
O problema é que todas essas questões, as que verdadeiramente importam, estão ou ausentes da discussão ou encobertas pelo debate em torno dos méritos e defeitos do real, do preço do pão e das tarifas de ônibus, dos juros e assim por diante.
Não que nada disso importe. Mas são apenas aspectos de um plano-ponte, até a posse do próximo presidente, nada mais do que isso. Repito: o Brasil vai continuar existindo depois dela, seja qual for o eleito. E os problemas reais também.

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