São Paulo, sábado, 9 de julho de 1994
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Mundial atrapalha o sono de Parreira

FERNANDO RODRIGUES ; MÁRIO MAGALHÃES
ENVIADOS ESPECIAIS A DALLAS

O técnico Carlos Alberto Parreira, 51, está dormindo menos em comparação a um mês. Dorme de cinco a cinco horas e meia por noite atualmente.
No início da Copa do Mundo, Parreira dormia seis horas por noite. Mas o técnico da seleção brasileira diz que ainda consegue ir para a cama sem a ajuda de soníferos.
Ontem, véspera do jogo contra a Holanda, Parreira não saiu do saguão do hotel na parte da manhã. Atendeu à Folha na porta do elevador.
Além de dizer que está mais tenso, reclamou da influência da mídia. "De cada 20 cartas que eu recebo, 18 falam dos temas que são comentados pela mídia."
Apesar da tensão, Parreira diz estar confiante: "Só uma fatalidade fará o Brasil perder para a Holanda". A seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha - Qual a diferença entre a seleção brasileira de hoje e a de 70, que foi campeã?
Carlos Alberto Parreira - É difícil de dizer. Aquele era um time muito bom. Tinha Pelé, Tostão, Jairzinho, Carlos Alberto... Mas o nosso time também é bom tecnicamente. Temos jogadores experientes e com vontade de superar as dificuldades. Portanto, tem algo similar com o time de 70.
Folha - Quando o time demonstrou essa similaridade?
Parreira - Quando estava perdendo o jogo para a Suécia. Empatou a partida e ficamos em primeiro do grupo. E também contra os Estados Unidos. Estávamos com um jogador a menos e voltamos para o segundo tempo para ganhar a partida.
Folha - Como foi a reação contra os Estados Unidos?
Parreira - Foi uma coisa emocionante. Primeiro eu falei, no intervalo. Depois, todos os jogadores gritaram. Falaram que iam ganhar mesmo com um a menos. E fomos lá. Eles tiveram uma fibra muito grande.
Folha - Qual o melhor time tecnicamente: o de 74, que perdeu para a Holanda, ou o atual?
Parreira - É muito difícil comparar épocas. São times com características diferentes. Nosso meio-campo de 74 começou com Piazza. Depois entrou o Carpeggiani. Tínhamos o Paulo César, o Rivelino. Na frente, tinha o Leivinha e o Jairzinho. O Valdomiro ajudava muito. O Valdomiro era como se fosse um Zinho.
Folha - E o time da Holanda de 74 em comparação com o atual?
Parreira - O time da Holanda marcou uma época no futebol internacional. Aquele time da Holanda nunca mais se repetiu. É evidente que o time de 74 é muito superior ao atual.
Folha - O que mudou do Parreira de 74 para o de hoje?
Parreira - Mudou pouca coisa, para dizer a verdade. O Parreira continua o mesmo.
Folha - O sr. tem dormido bem? Quantas horas por noite o sr. dorme?
Parreira - Eu estou mais tenso. É natural que eu esteja. Seria anormal se eu dissesse para vocês que eu estou dormindo maravilhosamente. A pressão vai aumentando. As exigências vão crescendo. E você vai, evidentemente, junto com isso aí.
Folha - Mas quantas horas por noite o sr. está dormindo?
Parreira - Estou dormindo umas cinco horas, cinco horas e meia por noite. No começo, dormia umas seis horas.
Folha - O sr. toma comprimidos para dormir?
Parreira - Não. Não estou tomando nada.
Folha - Mas o sr. disse, antes do início do Mundial, que havia trazido comprimidos e mas não estava usando...
Parreira - É. Mas, não estou tomando. E, se precisar, o dr. Lídio Toledo tem.
Folha - Qual tem sido a utilidade das palestras que são feitas com os jogadores?
Parreira - Olha, foram feitas tantas palestras que eu já perdi a conta. Agora, aqui na competição, temos que ter a medida certa para a coisa. Hoje (ontem), quando mostrarmos os vídeo com jogadas da Holanda, vamos ter um bate-papo.
Folha - Como são esses vídeos dos adversários?
Parreira - Para não ficar mostrando muitas partidas, o Júnior (Leovegildo Júnior, ex-jogador da seleção e atual espião da equipe) escolhe lances específicos de várias jogadas. Fica ótimo. Mostramos que são os melhores jogadores, como eles cobram escanteios, como se defendem etc.
Folha - Quem faz a exposição sobre o jogo?
Parreira - Todos nós.
Folha - Os jogadores também falam nessas ocasiões?
Parreira - Também. O Romário, no caso da Holanda. Porque conhece muito o jeito deles jogarem. O Romário, surpreendentemente, tem uma boa visão das coisas. Fez comentários importantes. O Dunga, também. O Dunga é ótimo (nessas análises).
Folha - Por que usou a expressão "surpreendentemente" quando se referiu à capacidade de Romário para analisar os adversários?
Parreira - Não... Porque as pessoas pensam que o Romário só quer saber de jogar. Mas Romário tem um feeling bom do futebol.
Folha - O sr. sabe que tem sido criticado no Brasil. Como o sr. sente aqui essa pressão?
Parreira - O torcedor é uma mera caixa de ressonância do que a mídia divulga. De cada 20 cartas que eu recebo, 18 falam dos temas que são comentados pela mídia. Ou seja, ela influencia muito. A mídia elege até presidente.
Folha - Uma das críticas à sua seleção é que o time não joga um futebol bonito, apesar de ter se classificado até agora. Qual a sua opinião sobre isso?
Parreira - No futebol, eu tenho dito, não adianta jogar bonito para ser campeão. O meu futebol, se não é bonito, pelo menos não é feio. O que eu não quero é voltar mais cedo para casa. Eu sempre quis que as minhas equipes jogassem bonito.
Folha - O coordenador-técnico da seleção, Mário Jorge Lobo Zagalo, diz que as pessoas que querem espetáculo devem ir a um circo. O sr. concorda com isso? Acha que a seleção brasileira de futebol não tem que dar espetáculo?
Parreira - Não foi de mim que ele ouviu isso. Mas quem quer espetáculo deve ir a um show, ver um cantor. Esporte é competição. Em esporte, tem que se vencer, não dar espetáculo.
Folha - O seu time hoje tem jogadores insubstituíveis?
Parreira - Bom, a gente não tem outro Romário aqui dentro. Mas tem uma coisa que ninguém fala: perdemos três jogadores da zaga e o time continuou jogando bem. Perdemos o Ricardo Rocha, o Ricardo Gomes e o Branco. E os substitutos continuaram bem. O time tem condições de superar a ausência de qualquer um.
Folha - Quem é o batedor oficial de pênaltis do Brasil durante um jogo?
Parreira - Quando estava jogando, o Raí batia os pênaltis. Se ele não joga, é o Bebeto.
Folha - O time treina faltas e, nos jogos, jogadores diferentes acabam cobrando. Por que acontece isso?
Parreira - Não sei. É coisa de jogo. Vai da cabeça dos jogadores na hora. Não tem como a gente ficar orientando ali, na hora.
Folha - Se o Hagi, da Romênia, fosse brasileiro ele jogaria no seu time?
Parreira - Jogaria porque é um excelente jogador.
Folha – A média de gols tem aumentado nesta Copa do Mundo. A que o sr. atribui isso?
Parreira - Basicamente, há duas coisas. Primeiro, às novas regras do futebol: do goleiro e os três pontos por vitória. Segundo, ao fato de os juízes estarem mais rigorosos na marcação e fazendo com que a bola fique mais tempo rolando.
Folha - Na sua opinião, até agora, quais são os melhores times do Mundial que estão nas oitavas-de-final?
Parreira - Pela última rodada, a Romênia. A Alemanha, que vem administrando os resultados com experiência. E a Itália, pelos valores que tem.

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