São Paulo, sábado, 9 de julho de 1994
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Caldeirão urbano

É preocupante o crescimento da violência nos grandes centros urbanos. Em São Paulo ocorrem em média 11,8 assassinatos por dia –um número muito alto até se comparado com o de outras metrópoles violentas, como Nova York, onde a média diária de homicídios é 6.
A polícia dá uma explicação imediata para esse índice elevado: a quantidade de armas comercializadas ilegalmente e o fácil acesso à bebida e às drogas. Há também a velha explicação de fundo socioeconômico: quanto maiores a pobreza e o desemprego, mais intensas a violência e a criminalidade.
Entre essas duas explicações, existe, entretanto, uma outra, mais difícil de quantificar, mas visível a olho nu por quem quer que viva numa grande cidade brasileira: a deterioração das condições de convivência social. Pois além dos problemas materiais tradicionalmente elencados como "fatores sociais" da violência –desemprego, fome, falta de moradia–, verifica-se uma degradação geral da vida cotidiana, motivada por um emaranhado de pequenos e grandes transtornos: trânsito, barulho, poluição, filas.
Atingindo praticamente todas as camadas e grupos sociais, tal conjunto de perturbações tende a elevar os níveis de estresse, frustração, impaciência e agressividade dos cidadãos. Tudo isso conduz a uma drástica queda dos padrões gerais de civilidade e respeito mútuo. O espaço para o convívio harmonioso diminui, e os freios morais à violência parecem ter eficácia menor.
Diante do enfraquecimento dos fatores tradicionais de coesão social –sem falar da desagregação das relações familiares–, a tendência à anomia, ao "cada um por si", é um perigo que nenhuma medida isolada pode derrotar. Além de providências urgentes como o efetivo policiamento das cidades, não podem deixar de ser consideradas propostas que visem a diminuição do caos urbano, tais como uma melhora do transporte coletivo que diminua o número de veículos em circulação, a maior eficiência dos serviços visando evitar filas e o controle rigoroso das fontes de poluição sonora e atmosférica. Só um conjunto de políticas de longo alcance poderá fazer com que as grandes cidades deixem de ser verdadeiros caldeirões a ferver a cabeça e o sangue de seus habitantes.

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