São Paulo, domingo, 10 de julho de 1994
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Condenação em AL traz à tona debate sobre sedução

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Joelson dos Santos foi condenado a cumprir pena de dois anos e três meses de reclusão no Instituto Penal São Leonardo, em Alagoas. Seu crime? Sedução.
A condenação foi imposta pela Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Alagoas, que manteve a sentença de primeira instância e rejeitou o recurso de Joelson.
O presidente da câmara, desembargador José Marçal Cavalcanti, discordou da decisão, mas foi voto vencido.
A divergência que surgiu entre os julgadores de Joelson espelha um debate que se trava hoje na sociedade. Discute-se se deve manter-se, ou não, a sedução como crime (leia texto abaixo).
A história de Joelson dos Santos aconteceu em Piaçabuçu, cidadezinha do interior alagoano. Ele tinha 34 anos. Sua namorada E. estava com 17 anos.
Os dois namoravam às escondidas. Tiveram relações sexuais várias vezes com o consentimento de E., que acabou engravidando.
Segundo os depoimentos das testemunhas, a menor tinha comportamento exemplar. "Obviamente era inexperiente... tudo leva a crer que" ela era virgem antes de conhecer Joelson, diz a decisão.
Para a maioria dos desembargadores que analisou o caso, E. era uma menor inexperiente que se deixou envolver pelas palavras e pelo jogo de cena do namorado sedutor.
"Presentes estão, pois, na conduta de Joelson dos Santos, os elementos essenciais do crime, quais sejam: a) o emprego de meios de sedução com abuso da inexperiência de E.; b) o desvirginamento mediante conjunção carnal; c) a idade da ofendida entre 14 e 18 anos (no caso, 17 anos); e d) o dolo específico, pois o acusado quis atingir o resultado, isto é, manter relações sexuais com a vítima", diz o acórdão (decisão de tribunal).
O desembargador Cavalcanti, que foi vencido, alegou que a justificável confiança e inexperiência da menor não se comprovaram.
Isso porque E. namorava escondida, engravidou no curto espaço de dois meses, aproximadamente, e continuou a manter relações com o namorado até sua mãe descobrir.
"A justificável confiança não existe em namoros curtos com encontros às escondidas", argumentou.
Já para os outros desembargadores, o fato de E. encontrar-se com o acusado às escondidas de sua mãe "mostra o quanto ela se submetia às suas orientações, confiando nas suas frases ilusórias e nas suas promessas vãs".
E. armou esquemas para se encontrar com Joelson. Ela dizia que ia para a casa da vizinha, mas ia para a casa do namorado. Quando a mãe a chamava, a vizinha respondia "já vai" e ia avisar E.. Outras vezes, a própria E. ouvia o chamado e voltava correndo.
Para a voz discordante no julgamento, com este comportamento E. não pode alegar sua inexperiência.
Cavalcanti terminou seu voto citando uma sentença de Minas Gerais, segundo a qual "a sedução é figura criminal inteiramente ultrapassada, inadmissível na década da pílula, da tanga, da gravidez de matéria plástica".
Segundo Luiz Flávio Gomes, juiz da 26ª Vara Criminal de São Paulo, são muito raros os processos por crime de sedução na capital paulista.
"Esta figura penal está em descrédito e tende a desaparecer. O Código Penal é de 1940, quando os costumes eram outros. A menor de hoje tem autodeterminação sexual", afirma.

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