São Paulo, segunda-feira, 11 de julho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O pueril e o importante

O esboço de atrito entre os presidentes Carlos Menem, da Argentina, e Itamar Franco não tem em si maior importância. Mas, para além de um episódio pueril, há razões concretas para possíveis tensões comerciais entre os dois países.
Desde que o plano Cavallo estabeleceu a paridade do peso argentino ao dólar, a balança comercial daquele país vem-se deteriorando. De um superávit próximo de US$ 8,6 bilhões em 1990, a Argentina passou a um déficit ao redor de US$ 3,5 bilhões no ano passado.
Essa excepcional mudança deveu-se principalmente ao crescimento das importações, estimuladas pela redução de alíquotas e pelo câmbio fixo. Nesse quadro, o Brasil, que exportava US$ 700 milhões em 1990, vendeu aos argentinos US$ 3,6 bilhões em 1993.
Como o Brasil goza das tarifas preferenciais do Mercosul, é natural que os setores afetados vejam no país um dos "culpados" pela crise.
Quando a situação da nação piora –e é ilustrativo que o comentário que deu início ao desimportante atrito ocorresse justamente face a um protesto interno–, crescem as pressões por soluções imediatas. A importância de longo prazo do Mercosul como instrumento de inserção no mercado internacional cede espaço à aflição causada por um déficit que não pára de crescer.
Há razões concretas, entretanto, a favor do Mercosul. Do déficit recorde de US$ 2,4 bilhões que a Argentina registrou no primeiro quadrimestre de 1994, apenas US$ 400 milhões deveram-se ao comércio bilateral com o Brasil, o que significa que o problema externo argentino tem razões de caráter geral, não especialmente ligadas às tarifas preferenciais do Cone Sul.
Ademais, a âncora cambial do Plano Real provavelmente valorizará em certa medida a moeda brasileira, o que tende a estimular as importações do Brasil e, assim, favorecer a balança comercial argentina.
A esperada estabilidade brasileira vem, portanto, em boa hora para impedir que disputas menores prejudiquem a necessária e já tardia liberalização comercial na região.

Texto Anterior: Na marca do pênalti
Próximo Texto: PT e PSDB em São Paulo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.