São Paulo, sábado, 23 de julho de 1994
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Osiris recebeu pedido 'em nome de Itamar'

DA SUCURSAL DO RIO

O ex-secretário da Receita Federal, Osiris Lopes Filho, acha que o episódio da liberação da bagagem da seleção brasileira prejudicou a meta perseguida por ele no cargo: mostrar que a lei é para todos.
Em duas entrevistas no Rio, uma para a imprensa estrangeira, ele fez um balanço de seu trabalho e ressaltou que o repúdio da população à liberação da bagagem mostrou que "o país não aceita mais privilégios".
Lopes Filho disse que antes do episódio já havia recebido um telefonema de "pessoa" que falou em nome do presidente da República pedindo a liberação da bagagem. Ele teria dito não e ameaçado se demitir.
Segundo o ex-secretário, a evasão fiscal no Brasil, que inclui sonegação, inadimplência e omissão, ficar entre US$ 40 bilhões e US$ 50 bilhões por ano, apenas em impostos federais. Em seguida, alguns trechos da entrevista:CBF
O presidente Ricardo Teixeira se opôs à vistoria e ameaçou cancelar o desfile em carro aberto. Ele chamou os jogadores para pressionar também. Para mim, os jogadores foram massa de manobra, já que a maior parte dos bens importados deve ser dos dirigentes.
REPERCUSSÃO
Pelas enquetes que eu vi, a população reconhece o valor do campeonato mas queria ver todos obedecendo a lei. Às vezes, numa crise ou numa derrota se aprende mais. A elite brasileira ainda não entendeu que o país quer o estado de moralidade.ERRO
O presidente Itamar Franco se prendeu a valores inferiores ao cumprimento da lei. Ele quis homenagear os tetracampeões, mas seguiu um caminho equivocado.
RECONHECIMENTO
Itamar é um dos poucos presidentes na história desvinculados dos grupos econômicos. Ele vai ficar como um moralizador, a despeito desse incidente. Ele sempre me deu apoio irrestrito.
DIFERENÇAS
O sistema tributário no Brasil é dos mais modernos, mas não tem eficácia. As classes média e baixas é que pagam mais. O imposto sobre grandes fortunas não pegou porque o Congresso é conservador. A carga tributária é pior distribuída que a renda.
VILÕES
Os dois maiores vilões hoje no Brasil são os sonegadores e os especuladores. Nos banqueiros, foi onde encontrei maiores resistências.
MAIS BANCOS
Eles (os bancos) não gostam de cumprir a lei do país. Gostam de proteger interesses dos sonegadores.
QUEM PAGA
Os assalariados pagam 70% dos impostos no Brasil. Dos 36 mil dirigentes das maiores empresas do país, cerca de 11 mil estão irregulares com a Receita Federal.
EVASÃO
Continua em 50% da base tributária, entre US$ 40 bilhões e US$ 50 bilhões por ano entre omissão, inadimplência e sonegação.
PROGRESSOS
A média histórica de arrecadação tributária no Brasil é de US$ 3,3 bilhões. Em dezembro deste ano a meta é de US$ 6 bilhões. No primeiro semestre deste ano a arrecadação subiu 24% em relação ao mesmo período de 93.
ESTRATÉGIA
Como temos carência de pessoal, mas contamos com apoio da imprensa, tentamos intimidar os sonegadores. Evitar, pelo menos, que eles dormissem tranquilos.
ENIGMA
DEMISSÃO
Já vinha desgastado com os problemas com o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), que, inclusive atrasarão as devoluções do Imposto de Renda. Sabia que ia encontrar resistências investigando as 600 maiores fortunas do Brasil, jogadores de futebol e dirigentes de escolas de samba.
O MOMENTO
Decidi conversando com minha família (mulher e filho) na quarta-feira à noite. Chegamos à conclusão que era melhor eu sair. Fomos jantar e na saída do Carpe Diem (restaurante em Brasília) encontrei um grupo de jornalistas. Fui e comuniquei a eles para tornar a decisão inevitável. Acabei sendo indelicado com o ministro Ricupero.
A SAÍDA
É uma derrota que propicia uma vitória. Possivelmente, houve o meu sacrifício, mas a Receita foi fortalecida. Deixou (o episódio) na defensiva as pessoas que acham que o país pode ser governado com jeitinhos e privilégios.
O TELEFONEMA EM NOME DE ITAMAR
A pessoa pedia para não cobrar o imposto em nome do que os jogadores fizeram. Disse não. É uma concepção não legal e eu estava em uma concepção legal. É outro enfoque (Osiris disse que naquele momento ameaçou se demitir).
O SUBSTITUTO
Meu substituto sempre foi da minha absoluta confiança. Perguntado, eu disse que ele deveria me substituir. A equipe deverá ser mantida.
FUTURO
Vou continuar participando como cidadão, mas não tenho ambições políticas. Nem sou filiado a partido.

LEIA MAIS
sobre o escândalo da superbabagem no caderno Esportes

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