São Paulo, sábado, 23 de julho de 1994 |
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Ufanismo ridículo
CLÓVIS ROSSI SÃO PAULO – Ufanismo e patrioteirismo já são duas coisas que enchem profundamente as medidas, para não dizer outra coisa. A conquista do tetracampeonato conseguiu, no entanto, elevar aos píncaros a quantidade de bobagens que se dizem ou escrevem com base nesses dois sentimentos.Quando a coisa serve apenas para vender sabonetes, leite ou o que seja, embalado na bandeira verde e amarela, ainda vá lá. Vender é preciso, principalmente nos tempos que correm, e vale tudo para fazê-lo. Agora, quando gente que tem lá a sua responsabilidade pública começa a exagerar, não dá para aguentar calado. Refiro-me em especial ao texto do ex-presidente José Sarney publicado ontem, no canto aí ao lado. Final do texto: "PS – Ponho a minha opinião na bagagem nos tetracampeões. Eles traziam uma coisa que não paga taxa aduaneira: a auto-estima nacional que tinha saído do Brasil". Essa história de que a auto-estima foi resgatada pelo tetra, convenhamos, é uma bobagem sem tamanho, que o ex-presidente me perdoe a irreverência. Se um país recupera a auto-estima apenas porque o Baggio e o Baresi erraram seus pênaltis e o Branco e o Dunga acertaram, esse país reduziu o conceito de auto-estima ao nível mais microscópico possível. Basta fazer o raciocínio inverso. Se tivesse ocorrido o contrário, ou seja, o Baresi e o Baggio acertarem e o Dunga e o Branco errarem, o que preconizariam Sarney e os demais postuladores da auto-estima reconquistada? Que a pátria cometesse suicídio coletivo? Mais: suponhamos que a seleção ganhe o pentacampeonato, na França em 1998. Se o tetra bastou para recuperar a auto-estima, o penta certamente levaria o presidente de turno a bater às portas do G-7, o grupo dos sete países mais ricos do mundo, para pedir o ingresso do Brasil, exibindo a Taça Fifa como senha. A festa, a alegria, o circo, tudo bem. Até na Suécia se fez e apenas com o terceiro lugar. Mas sentir-se, como sociedade, mais ou menos estimada só por perder ou ganhar a Copa, é de um ridículo atroz. Texto Anterior: Bene ma non troppo Próximo Texto: Os patos e a classe média Índice |
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