São Paulo, domingo, 24 de julho de 1994
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São Paulo em estado de sítio

JOÃO MARCOS CARVALHO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há 70 anos, no dia 28 de julho, depois de 23 dias de batalhas, terminava em São Paulo a Revolução Tenentista de 1924, com um saldo de 503 mortos e 4.846 feridos. O episódio passaria à história como o "segundo 5 de julho", em referência à coincidência de datas de seu início e da primeira Revolução Tenentista, ocorrida em 1922.
O movimento de 24 era comandado pelo general Isidoro Dias Lopes e pelo major Miguel Costa, da Força Pública Paulista, que, entre outras coisas, exigiam a deposição do presidente Artur Bernardes.
Os "tenentes" voltavam à cena política dois anos depois de terem tentado depor Epitácio Pessoa, num episódio cujo desfecho tinha sido a marcha dos "Dezoito do Forte", em Copacabana.
Apesar de terem tido influência fundamental durante os primeiros anos da implantação da República, os militares foram, aos poucos, perdendo o poder para os "barões do café", oligarcas que passaram a controlar o Estado e dominar a política, elegendo cada vez mais deputados, senadores, prefeitos, presidentes de Estado e da República.
Os Estados de São Paulo e Minas, cujas economias centravam-se no cultivo do café e na pecuária leiteira, respectivamente, assumem o controle quase absoluto da República, afastando os militares do poder decisório.
Simultaneamente, a política da valorização do café fazia cair as exportações e os preços dos produtos no mercado internacional. Pressionados pelos interesses de São Paulo e Minas Gerais, o presidente Epitácio Pessoa (1919-1922) recorre a empréstimos externos, o que tem reflexos inflacionários imediatos.
Nos quartéis, a tensão eleva-se ao máximo com a indicação de Artur Bernardes –que representava a continuação desse processo– para suceder Epitácio Pessoa. Eleito presidente, mas ainda não empossado, Bernardes começa a enfrentar a oposição aberta de jovens militares, capitães e tenentes, em sua maioria, e que haviam apoiado a candidatura de Nilo Peçanha, seu opositor.
Os "tenentes" (como ficou conhecido esse agrupamento de jovens militares), através do Clube Militar, foco de constantes conspirações, exigem a recontagem de votos, alegando fraude.
A 2 de julho, Epitácio manda prender o marechal e ex-presidente Hermes da Fonseca (que apoia o movimento), causando insatisfação nas casernas. Posteriormente, fecha o Clube Militar com lei que o compara a um bordel.
Na madrugada de 5 de julho de 1922 rebentava, no Rio, a primeira Revolução Tenentista. Agindo com rapidez, o governo sufoca o levante em menos de 24 horas.
Na manhã do dia seguinte, o sub-comandante do Forte Copacabana, 1º Tentente Siqueira Campos, comandando 16 homens e um civil que aderia à última hora, marcha pela calçada da avenida Atlântica, num ataque suicida contra 3 mil legalistas, que aguardavam o grupo dois quilômetros adiante. Do combate, restaram vivos apenas Siqueira Campos e o tenente Eduardo Gomes, gravemente feridos e que se tornariam os heróis do movimento.
Artur Bernardes toma posse em 15 de novembro do mesmo ano e determina à polícia rigorosa vigilância sobre a oposição. Cria um exército de espiões e promove reformas constitucionais reacionárias, restringindo as liberdades individuais e limitando o habeas-corpus. Mantém a censura à imprensa, passando a controlar todas as informações.
Agindo com extrema cautela e dentro da mais rigorosa clandestinidade, os oficiais condenados e foragidos de 22 conspiravam. O general de brigada reformado Isidoro Dias Lopes, então com 59 anos e considerado um brilhante estrategista, além de simpático ao movimento, foi escolhido como chefe.
Representantes do movimento operário procuraram-no para oferecer-lhe apoio, mas jamais foram recebidos pelo chefe do levante, que não aceitava a formação de batalhões de operários armados, pois via nisso a possibilidade de que o proletariado tomasse a frente da revolução.
Enquanto isso, preocupados em deflagrar a luta, os "tenentes" conspiravam cada vez com maior velocidade. Após receberem a adesão do tenente Custódio de Oliveira, do 2º Grupo Independente de Artilharia Pesada (2º GIAP), começam a elaborar o plano de ação. A primeira providência foi alugar um sobrado na rua Vauthier, nº 27, no Pari, que se tornaria o QG da conspiração.
No dia 3 de julho tudo estava pronto, os planos preparados e os contatos feitos. Os rebeldes acreditavam que a surpresa, aliada a golpes de audácia, causaria a queda da capital em poucas horas.
O plano rebelde previa, após a tomada de São Paulo, o deslocamento de forças até Barra do Piraí, no Estado do Rio, onde posteriormente, evoluiriam até a capital da República, para depor Bernardes. Outros contingentes ocupariam a Baixada Santista, evitando o desembarque de fuzileiros navais. No dia 5 de julho seria deflagrado o levante.

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