São Paulo, domingo, 24 de julho de 1994
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Não há vento na Lua

ANTONIO CARLOS DE FARIAS

Antonio Carlos de Faria
RIO DE JANEIRO – Revi as imagens do tricampeonato de 70 e dos primeiros passos do homem na Lua. Na primeira vez, incríveis, vinham em preto e branco. Hoje, as cores traem minhas memórias.
Os magníficos passes de Gerson ficaram gravados pela perfeição de suas elipses e senóides.
Agora esses desenhos rivalizam com o verde da grama, os amarelos e azuis dos uniformes, e todos os matizes de espanto dos adversários.
Há 25 anos, quando Neil Armstrong deu o grande passo da humanidade, e disse aquela frase que deve ter ensaiado por muitos dias na Terra, eu estava com olhos vidrados na TV e com a cabeça na Lua, tentando entender o que via.
Mas dos passos audaciosos, o que recordo é a luminescência prateada do traje espacial. Como se o astronauta por estar na Lua tivesse adquirido um pouco de sua substância.
As estrelas da bandeira americana, colocada por Edwin Aldrin como símbolo da conquista do satélite, vinham em fundo negro, assim como estão no universo. Os azuis e vermelhos atuais fazem com que as imagens percam um pouco da veracidade.
Um amigo, que morava no interior da Bahia e naqueles anos ainda não tinha televisão, viu as mesmas cenas no cinema, também em preto e branco.
Hoje, suas lembranças dos filmes apresentados depois dos cinejornais vêm em gradações do cinza. A ficção, para ele, se rendeu ao limite bicromático da retratação jornalística.
O mundo novo que chegou com a TV em cores não deixou lembranças coloridas.
Talvez porque nunca mais tenha havido imagens tão marcantes quanto os dribles de Pelé ou as pegadas de Armstrong, até hoje fixadas na areia da Lua, mesmo que ninguém as esteja vendo.

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