São Paulo, domingo, 24 de julho de 1994
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Lula e as pesquisas

CÉSAR MAIA

As pesquisas de opinião pública, segundo alguns especialistas, servem em geral para motivar ou desmotivar as campanhas ou para conseguir apoio e recursos. Raramente elas servem para o que são feitas: analisar e orientar as campanhas.
Estudos realizados sobre os caminhos que levam ao voto –e destaco a recente edição do trabalho de Popkin– mostram que a decisão do eleitor é racional, num quadro de informações insuficientes.
Mostram, também, que o currículo, a história e a popularidade dos candidatos têm seu peso, mas o que decide as eleições é a campanha, a performance dos candidatos em campanha.
As pesquisas de opinião realizadas antes da campanha sinalizam graus de simpatia e de conhecimento, mas ainda não a decisão de voto. Elas devem ser decodificadas de forma a não criar ilusões ou a não desanimar os candidatos.
No Brasil, somente quando o horário eleitoral –na televisão e no rádio– começa a ser transmitido é que os eleitores se dão conta de que haverá eleições. Antes disso, há uma espécie de aquecimento através da mídia impressa.
Se os candidatos tomam as pesquisas pré-campanha como opinião do eleitor, terminam por atuar de modo a confirmá-las. São vários os exemplos disto. O mais próximo foi a performance de Collor, no primeiro turno.
As pesquisas pré-eleitorais apontavam Collor disparado, na faixa de 40% a 50%. Os seus adversários o trataram desta forma, o que foi fundamental para ele, que no final mal alcançou 28%, quase a metade do que indicavam as pesquisas de julho, antes do horário eleitoral.
A formação da opinião dos eleitores não é um processo unilateral –dos meios de comunicação para o cidadão ou do candidato para o eleitor– mas um processo complexo, onde os meios de comunicação, a publicidade e os candidatos acionam os eleitores, que testam entre si as informações recebidas, antes de tomar a decisão de voto.
O quadro pré-campanha ainda é unilateral e não induz à formação de opinião do eleitor. Somente quando tem a certeza de que haverá eleição, o eleitor inicia seu processo de formação de opinião.
É claro que uma posição cômoda pré-campanha ajuda, desde que a campanha absorva corretamente os pontos fortes e fracos da candidatura. O eleitor vota positivamente, ou seja, vota para que aconteça alguma coisa. Relaciona causa e efeito. Nas pesquisas pré-campanha, o cidadão ainda não se posiciona como eleitor. Reage negativamente, ou seja, seleciona por exclusão.
As candidaturas que enfrentam os maiores problemas são exatamente as favoritas no quadro pré-campanha. Principalmente porque são tentadas a adotar uma posição defensiva e inercial, como se a opinião do cidadão já fosse a opinião do eleitor.
Pode ser o caso de Lula. Se a sua assessoria se dispusesse a estudar as teorias do voto e a analisar as pesquisas que lhe dão –ou davam– uma margem próxima aos 40% certamente teriam introduzido realismo na pré-campanha.
Por exemplo: as pesquisas que perguntavam sobre razões –quem é o mais competente, quem é o mais experiente etc.– causavam um certo embaralhamento entre os candidatos.
A única pergunta que destacava o candidato do PT indagava sobre qual candidato se parecia mais com o povo ou conhecia melhor os seus problemas. Ou seja, a liderança destacada de Lula ainda não estava no terreno propositivo –causa e efeito.
Além do mais, a desconfiança deveria tê-los alertado. Seria improvável que, naturalmente, a opinião do eleitor do interior de Minas Gerais ou do interior do Nordeste desse a Lula algo em torno dos 50%.
Se os cruzamentos fossem feitos corretamente, Lula seria informado que as pesquisas estavam com a gordura da pré-campanha, de um nome que se aproximava mais –pela extração e pelo currículo– do perfil do eleitor popular. Mas que isto não significa, ainda, uma opção para presidente da República.
Feitos os cruzamentos, tomando entre outras coisas a maneira pela qual se forma o voto no interior –a assessoria de Lula deveria ter dito a ele que estaria entrando na campanha com uma importantíssima margem de 25% da preferência dos eleitores. E mais. Que embora já houvesse passado pelo teste de identificação, ainda precisava passar no teste mais importante: para que votar nele?
A primeira pesquisa efetivamente eleitoral será aquela cujo campo for feito dez dias após a entrada do horário eleitoral. Neste sentido, os primeiros programas de TV são fundamentais.
É aí que os candidatos devem concentrar a mensagem capaz de levar os eleitores a desenvolver uma relação de causa e efeito a favor deste ou daquele candidato.
No momento em que o eleitor é "informado" de que haverá eleição, ele inicia o processo de interação com aqueles cuja opinião acha relevante. Se o PT analisar a curva de Lula em 89, verificará que ele mudou de patamar exatamente neste momento, que os primeiros programas foram decisivos.
Hoje, com os cruzamentos e cortes feitos de cabeça fria, Lula aponta expectativas para 25% do eleitorado, o que é muito importante. Se as peças centrais de sua campanha trabalharem com os números divulgados –35% a 40%– poderão difundir um quadro errôneo de decréscimo, quando o que ocorre, na verdade, é um processo natural de acomodação, posicionando Lula no nível extraordinário de 25%.
Nível extraordinário e complexo, porque atrai a fúria dos adversários e que não garante nada, sem a campanha, principalmente se aliado à ingenuidade dos assessores, impressionados com as pesquisas pré-campanha.
Melhor seria que os assessores se preocupassem com os primeiros programas, que vão informar as razões ao eleitor, para comparação junto a seus pares, numa caminhada que só aí começa.

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