São Paulo, quarta-feira, 27 de julho de 1994
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A ética do código

FERNANDO SANCHES CASCAVEL

Embora devamos louvar a iniciativa de se produzir um Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo, tal documento padeceu do pecado de ter sido elaborado apenas por alguns "iluminados", sem qualquer participação de quem está diretamente envolvido no problema: o dirigente da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil.
O decreto, assinado pelo presidente Itamar, cheira a decreto-lei e o nobre conselheiro da OAB/SP (Ordem dos Advogados do Brasil), Modesto Carvalhosa, ao comentar o Código de Ética em artigo na Folha, não denunciou a ausência das outras entidades na sua elaboração.
Por que só a OAB? Será que a ética é apenas uma questão jurídica? Os "iluminados" olvidaram-se de que um verdadeiro Código de Ética deve conter direitos e deveres, numa correspondência biunívoca, para o pleno exercício da democracia.
Como poderá um profissional servidor público garantir o direito de terceiros se o seu é frequentemente violentado?
Quando um trabalhador das empresas tem qualquer pendência com os seus empregadores, ajuíza ações que, além do custo zero, na Justiça do Trabalho, serão julgadas por uma representação paritária, enquanto um profissional servidor público, para ajuizar um mandado de segurança, desembolsará, no mínimo, R$ 45,00, e o processo será julgado por um juiz monocrático que, não raro, invoca questões de conveniência e de oportunidade, para assegurar um direito líquido e certo.
No Código de Ética do presidente Itamar não consta, por exemplo, que os detentores de mandatos estão proibidos de nomear parentes, amantes, gigolôs e até mesmo empresários interessados exclusivamente em engordar suas finanças.
O pior de tudo é que muitas dessas nomeações recaem sobre pessoas que sequer detêm o mínimo de conhecimento e de experiência necessários ao perfeito e eficaz desempenho das atribuições inerentes aos cargos que irão ocupar.
Como poderá um profissional servidor público acatar ordens que são emanadas de quem não só está despreparado como, frequentemente, age em completo descompasso com a finalidade do cargo que ocupa?
Enquanto o objetivo, explícito, é o de enxovalhar a imagem dos profissionais servidores públicos, vamos continuar a amargar as filas do INSS, da Polícia Federal, dos hospitais, das escolas de 1º e 2º graus, das universidades etc. Era só o que estava faltando para infernizar a vida do profissional servidor público: um Código de Ética que foge à ética!

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