São Paulo, quarta-feira, 27 de julho de 1994
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Cameron transforma comédia francesa em ação

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA

O filme "True Lies", que estreou há duas semanas nos EUA, é um "remake" da comédia francesa "La Totale" estrelado por Arnold Schwarzenegger e dirigido por James Cameron.
Para ambos, o filme –que custou, segundo diversas fontes, mais de US$ 100 milhões e levou dez meses para ser completado– é um projeto importantíssimo.
Para Schwarzenegger é o primeiro filme depois da "débâcle" de "O Último Grande Herói". Para Cameron –que dirige Arnold, seu amigo pessoal, pela terceira vez– é a primeira comédia, e o primeiro projeto tocado por sua empresa independente, a Lightstorm.
Em "True Lies", Arnold é um agente secreto de elite que, devido à natureza de seu trabalho, é obrigado a mentir constantemente para sua mulher (Jamie Lee Curtis) sobre o que faz na vida.
A mulher, por sua vez, se sente atraída por um tipo misterioso, que se apresenta como agente secreto –mas, na verdade, é um vendedor de carros usados (Bill Paxton).
Quando verdades e mentiras se cruzam, no calor de uma luta contra terroristas (convenientemente árabes), Arnold e Jamie se vêem obrigados a revelar suas verdadeiras faces –e o resultado é uma mistura altamente assistível de risos e emoções fortes.
James Cameron conversou com a Folha em Los Angeles.

Folha - Este filme é baseado numa comédia francesa, "La Totale". Por que você, que costuma originar todos os seus projetos e escrever todos os seus filmes, resolveu fazer um "remake"?
James Cameron - Porque o filme francês era muito, muito engraçado. E eu sempre quis fazer uma comédia, há muito tempo tenho interesse em fazer uma comédia.
Mas não colocaria "True Lies" exatamente como um "remake" –o que fiz foi uma verdadeira desconstrução do filme francês e uma reconstrução seguindo uma estrutura completamente diferente. Se você vê os dois filmes você percebe uma ligação, mas isso é tudo.
Folha - Em que sentido você "reconstruiu" o filme francês, modificando-o?
Cameron - Eu queria expandir a ação, basicamente. Queria trazer mais ação para o filme e tornar a comédia mais universal. Eu queria que qualquer pessoa casada, de qualquer nacionalidade ou "background", pudesse se identificar com o personagem de Arnold.
Algumas cenas, contudo, eram tão geniais no filme original que não resisti em transplantá-las quase na íntegra para meu filme.
Folha - A última vez que Arnold misturou comédia com ação num filme –"O Último Grande Herói"– a combinação não foi bem-sucedida. Isso é um fator de preocupação para você?
Cameron - Não. A combinação de comédia e ação funciona, basta fazer direito. É como fazer sopa: é preciso combinar os elementos certos na proporção certa. Para mim, "True Lies" é uma comédia de ação, na qual as duas partes estão completamente integradas.
Folha - Como nos filmes de James Bond?
Cameron - Como nos filmes de James Bond, mas também como em vários filmes "cult" dos anos 60, quando parece que havia uma fascinação com a idéia do espião, da espionagem. Séries de TV como "I Spy", "O Agente da Uncle" –existe um pouco de tudo isso, um retorno à visão que a cultura popular tem dos espiões. Que, na verdade, é muito mais interessante do que aquilo que os espiões são na vida real: um bando de mentirosos sem caráter.
Folha - Você diria que, por causa dos custos altos de produção e, principalmente, por causa do desempenho fraco de "O Último Grande Herói" há uma cobrança maior em cima de você, de Schwarzenegger e deste filme?
Cameron - A cobrança não é maior que a que tive com "O Exterminador do Futuro 2". Uma vez que você atinge esse nível, esse ponto de saturação, tudo é um contínuo. Eu e Arnold estamos nesse contínuo.
Arnold está sob pressão máxima desde que se tornou um superastro internacional. Eu estou sob pressão desde que fiz o primeiro "Exterminador". Não se pode aumentar uma pressão que já está no máximo. Tem-se apenas que aprender a viver com ela.
Creio, contudo, que os distribuidores ficaram um pouco nervosos diante do resultado de "O Último Grande Herói" e, durante muito tempo, hesitaram em posicionar "True Lies" como um filme engraçado.
Folha - O que deu errado em "O Último Grande Herói"?
Cameron - As platéias não vão ver um filme, principalmente um divertimento escapista como um filme de ação, para serem constantemente repreendidas e lembradas do fato de que estão vendo um filme, e que o filme é estúpido. Isso é o equivalente a dar um tiro no próprio pé, com sua própria arma. Com ou sem Arnold Schwarzenegger.
Folha - O filme de ação, na sua opinião, tem futuro?
Cameron - É claro! Enquanto o cinema for uma jornada, algo que tira você do seu dia-a-dia, da realidade, e o transporta para um outro plano, vai haver um lugar para o filme de ação.
Muitos dos primeiros filmes mudos eram, na verdade, filmes de ação, com perseguições espetaculares e heroínas em perigo. O filme de ação satisfaz os impulsos e desejos do ser humano.

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