São Paulo, sexta-feira, 29 de julho de 1994
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Politicamente corretos imitam stalinistas

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Nos EUA, a militância politicamente correta ultrapassou qualquer limite do ridículo. Como se não bastasse a histeria dos grupos minoritários (não me surpreenderia se os portadores de unhas encravadas organizassem uma Olimpíada só para eles), agora, em nome da moralidade e dos bons costumes, a guerrilha neovitoriana conseguiu se superar. Provocou um episódio de espantar até fundamentalista islâmico.
O fato ocorreu no último dia 23 de maio em Woodstock (população: 4,3 mil habitantes), no Estado sulista da Georgia. Atente: nos Estados Unidos, Estado sulista é sinônimo de ultraconservadorismo.
Depois de dar turno de dez horas no restaurante em que trabalha como cozinheira, Lynn Kivi, 35, pegou seus dois filhos, Sarah, 12, e Chuck, 9, e dirigiu-se ao supermercado Winn-Dixie para fazer compras.
No carro, as crianças começaram uma discussão boba que continuou dentro da loja. O menino não parava de provocar a irmã e, em dado momento, desafiou a mãe com um palavrão qualquer.
Lynn decidiu assentar a poeira aplicando um safanão na orelha do peraltinha. O moleque chorou um pouco e a história teria acabado por aí, não fosse o telefonema de uma funcionária do supermercado à delegacia mais próxima para denunciar o "ato violento".
Quando chegou ao estacionamento do Winn-Dixie, Lynn foi surpreendida por um policial que a levou –algemada– para a delegacia. Acabou sendo autuada por "crueldade contra crianças", crime com pena prevista em até 20 anos de reclusão.
Depois de pagar uma fiança de US$ 22 mil, ela foi liberada. No momento, aguarda julgamento em liberdade e contratou um advogado que cobra por hora para defendê-la.
Chuck declarou à revista "People": "Isso é tudo bobeira. Foi só um tapinha porque eu fui malcriado". Sarah, por uma vez, concordou com o irmão: "Os policiais não deveriam ter prendido minha mãe, ela não fez nada de errado."
Eu pergunto: será que o ato de dar um peteleco no próprio filho automaticamente faz da mãe um Herodes? Ou será que essa praga do politicamente correto não está se transformando em uma perigosíssima forma de stalinismo espontâneo?

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