São Paulo, quarta-feira, 3 de agosto de 1994
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É pura censura

JOSÉ DIRCEU

A hora da militância petista chegou; se não podemos vê-la na TV,a veremos nas ruas
"Mínimo de liberdade e máximo de proibição." Assim, Luís Francisco Carvalho Filho, articulista desta Folha, resume perfeitamente a regulamentação que rege hoje o horário eleitoral. É pura censura.
Sustentada na aliança PSDB-PFL, os novos censores têm nomes: o senador Covas e os deputados José Serra, Dornelles, Genebaldo Correia, do PMDB, de triste memória, e Luís Eduardo Magalhães, filho de ACM, cacique maior do PFL.
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) só piorou a lei. E o resultado é muito concreto: o espaço gratuito é reduzido à ineficácia total, enquanto a mídia faz a campanha do PSDB/PFL. Agora a mídia já começou a desmoralização do que restou do espaço eleitoral gratuito.
Eu fui o autor do projeto original desta lei. As emendas o desfiguraram totalmente, dotando-o de várias inconstitucionalidades. Fui ao STF (Supremo Tribunal Federal), mas perdi. O resultado é o que o eleitor vê hoje na TV.
A origem de todo esse processo de censura é a emenda apresentada pelo deputado José Serra, do PSDB, impondo restrições técnicas aos programas eleitorais.
A partir daí o TSE entrou na campanha. E chegou ao absurdo de proibir a presença de candidatos do mesmo partido a diferentes cargos no mesmo programa. A decisão é uma afronta ao Poder Legislativo. Emenda de Serra que pretendia limitar o acesso ao horário gratuito apenas aos filiados ao partido foi rejeitada pelo relator do projeto, em 9/09/93.
Se o legislador não admitiu restrições a simples apoiadores, como o Judiciário pode proibir o acesso de filiados e mesmo candidatos?
O horário é destinado aos partidos e sua distribuição é feita de acordo fundamentalmente com a representatividade que cada um tem na Câmara dos Deputados. São os partidos os responsáveis pelos programas e por óbvio autorizam a participação ou não de convidados, responsabilizando-se por eventuais excessos.
As restrições, portanto, conduzem na direção do enfraquecimento dos partidos. É a velha concepção paternalista de política. É o jogo do fisiologismo, que reforça a idéia de que o eleitor deva escolher o candidato independentemente de seu partido. Mas qualquer tipo de restrição aos direitos políticos só pode existir a partir de leis aprovadas pelo Congresso.
Os ministros do TSE têm declarado que as restrições aprovadas baseiam-se na "intenção do legislador". É verdade que o deputado José Serra conseguiu fazer aprovar a emenda que impede a utilização de imagens externas no programa eleitoral.
Ele fundamentava sua emenda alegando pretender diminuir os gastos milionários com o programa eleitoral. Basta ver quanto o PSDB/PFL está gastando na campanha para perceber que custo não passa de desculpa.
Na verdade, o que estava por trás da emenda do PSDB era a intenção de impedir o acesso dos partidos da Frente Brasil Popular à mídia. Queria garantir às elites a continuidade do monopólio dos meios de comunicação de massa durante o processo eleitoral.
Associado a esse espírito, o TSE também impôs uma série de interpretações sobre o que seriam "montagens", "trucagens" e "gravações externas". Interpretou que o legislador pretendeu impedir a divulgação de comícios e manifestações populares. Onde o TSE foi achar tal "intenção"? Na cabeça do PSDB e do sr. Serra?
Pretende também o TSE impedir que candidatos presidenciais apareçam, falem ou participem dos horários destinados às eleições proporcionais e estaduais.
Tal proibição, além de inconstitucional, só contribui com os projetos pessoais, como aquele vexaminoso que a nação recentemente assistiu: a eleição de Collor. O Brasil aprendeu e não vai repetir essa história, que só se tornou vitoriosa por falta de partidos fortes e consolidados.
Mas tem gente que está feliz com estas proibições. Quer fazer crer ao eleitor que não estará levando ao horário eleitoral seus apoiadores apenas porque estas cenas estão proibidas. Não é verdade.
O PSDB e os demais partidos que representam as elites têm o que esconder do eleitor: a face de seus amigos, os empreiteiros, os banqueiros, como Andrade Vieira, os latifundiários como Cabrera, e outros velhos oligarcas.
A Justiça Eleitoral os ajudou. Brecaram a criatividade, e remeteram a propaganda eleitoral para a Idade da Pedra. Para a Lei Falcão, TV sem imagem externa é o mesmo que jogar futebol sem bola, truco sem baralho. Enfim, entregaram a campanha ao monopólio da comunicação.
Mas para quem já atravessou os longos anos de censura e conseguiu manter viva a semente da esperança, o desafio está lançado. O que restou do horário gratuito será suficiente para garantirmos Lula Lá e Zé Aqui. O horário eleitoral será nossa principal arma de comunicação e mobilização. A hora da militância petista chegou.
Se não poderemos vê-la na TV, a veremos nas ruas.

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