São Paulo, sexta-feira, 5 de agosto de 1994
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Populismo impede Corinthians de avançar

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Não deve ser nada fácil treinar um time como o Corinthians. Ou melhor: não deve ser nada fácil tentar fazer do Corinthians um verdadeiro time –quanto mais um timão– de futebol.
Ao longo dos anos, se há uma constante que se repete na história do clube é a de demissões e contratações que não obedecem a uma estratégia de longo prazo, mas à precipitação dos dirigentes ou às pressões irracionais dos torcedores.
Em ambos os casos, a paixão prevalece sobre a razão. Graças ao impulso para a satisfação das expectativas imediatistas da torcida, técnicos e jogadores vêm e vão sem que se entenda muito bem o porquê. Se, para a maioria dos políticos brasileiros, o futuro é sinônimo de "as próximas eleições", para os dirigentes corintianos o futuro é o próximo campeonato.
É nesse contexto que se pode entender o empenho da direção do clube em contratar jogadores como Branco e Ricardo Rocha. É claro são bons jogadores e é mais claro ainda que a defesa do Corinthians precisa de reforços. O que se pergunta é: por que o clube tem uma longa tradição de contratar jogadores consagrados, caros, em más condições físicas, no crepúsculo de suas carreiras? Por que não investir em novos talentos vindos das divisões inferiores do time ou do interior? Até Garrincha, depois de estragado pela incúria médica, passou pelo Timão.
Por outro lado, por que um técnico competente e experiente como Carlos Alberto Silva é demitido abruptamente, sem ter tempo de consolidar um trabalho que vinha dando frutos e que levou o time a chegar perto do título paulista? Contam-se nos dedos os técnicos que, nas últimas décadas, duraram mais de uma temporada no Corinthians.
O que parece explicar os dois fenômenos –contratação de craques veteranos e demissão injustificada de técnicos– é a falta de autonomia da direção do clube diante das pressões e expectativas da torcida. Esta quer resultados, e para já. Num populismo arcaico, os dirigentes "jogam para a torcida" com lances espetaculares. Perdeu o campeonato? Fora, técnico. Precisa contratar jogador? Chama alguém com nome e títulos. Um jogador como Viola, revelado pelo próprio Corinthians, é um caso isolado.
É desnecessário dizer que esse tipo de imediatismo inviabiliza um trabalho sério de formação de elenco, de montagem de uma estrutura técnica competitiva e perene. Um Telê seria impossibilitado, se trabalhasse no Corinthians, de levar adiante seus projetos meticulosos de aprimoramento tático e técnico dos atletas com quem trabalha. Um Cafu não teria tido chance de despontar no Parque São Jorge.
Talvez o São Paulo só tenha podido se tornar o supertime que é hoje graças à relativa ausência de pressão de sua torcida. Parece haver uma relação mais serena e madura entre o tricolor e seus torcedores.
No Corinthians, em contraste, prevalece uma relação quase coronelista entre os dirigentes e o clube e um autêntico messianismo da torcida com relação a técnicos e jogadores. O corintiano está sempre à espera do craque salvador ou do técnico milagroso que vai levar o time aos títulos.
Como grande parte da população brasileira, a "nação corintiana" (a expressão é significativa) vive na expectativa da vinda do salvador da pátria, do redentor de anos e anos de sofrimento.
Enquanto não se der conta de que no futebol moderno a vitória é cada vez mais o fruto de planejamento sério e trabalho paciente e não do acaso e do emocionalismo, o Corinthians estará condenado a sempre morrer na praia. E a aguentar, como o autor destas linhas, a impiedosa gozação de são-paulinos e palmeirenses.

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