São Paulo, domingo, 7 de agosto de 1994
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Atores de TV sul-africanos se escondem do Inkatha

The Independent
De Londres

JOHN CARLIN

Na África do Sul, um diretor de cinema, um produtor, seis atores e suas famílias tiveram que buscar esconderijos depois que suas vidas foram ameaçadas por simpatizantes do Inkatha-Partido da Liberdade, conservador.
Essa versão sul-africana da controvérsia que cerca a obra de Salman Rushdie seguiu-se a uma decisão da SAB (South African Broadcasting Corporation) de ignorar a pressão do Inkatha e transmitir no último fim-de-semana o filme "The Line", que trata, entre outras coisas, de violência política.
Representantes do Inkatha alegaram que o filme, uma co-produção com o Channel Four britânico já transmitida no Reino Unido, insultava os partidários dos zulus, culpando-os pela onda de mortes nos bairros negros nos últimos anos e, especificamente, por massacres nos trens de subúrbio.
Na quinta-feira, um porta-voz da National Hostel Resident's Association, estreitamente ligada ao Inkatha, ligou para a Sapa (iniciais em inglês de Associação Sul-Africana de Imprensa) advertindo quanto a possíveis consequências negativas de uma transmissão do programa, considerado ofensivo.
Phulani Mlotshwa disse no dia seguinte que "televisionar 'The Line' causará mais violência nos trens, e as vidas do produtor e dos atores estarão sob ameaça... Gostaríamos de removê-los permanentemente da face da Terra".
Segundo ele, a "fatwa" seria imposta por unidades especiais do Inkatha, treinadas pelo Movimento de Resistência Africâner, organização de extrema direita liderada por Eugene TerreBlanche.
No último final de semana, 400 manifestantes do Inkatha protestaram defronte à SAB exigindo que o programa fosse retirado do ar.
Brian Tilley, autor e diretor, disse, de seu esconderijo, que as campainhas de alarme haviam começado a soar depois que o fator MRA entrou na equação.
"Subitamente compreendi que esse homem estava fazendo um apelo às armas pelo rádio".
Ele e o produtor Jeremy Nathan apresentaram acusações por intimidação e incitamento à violência contra a Hostel Association antes de entrar em contato com o elenco e, com assistência da SAB, oferecer aos atores a opção de passar o final de semana num lugar seguro.
Ramolao Makhene é um dos protagonistas do filme que aceitaram a oferta. "Estava preocupado com as reações dessas pessoas mas pensei, 'dane-se, precisamos contar as coisas como são'."
O que perturbou o Inkatha foi o fato de que a história gira em torno de um jovem ativista de Soweto que sobrevive a um massacre num trem executado por um membro do Inkatha armado de um fuzil AK47.
Como única testemunha sobrevivente, ele se transforma em alvo do homem do Inkatha e também da polícia, que é identificada como fornecedora de armas aos homens do partido contra os "camaradas" do Congresso Nacional Africano.
"O filme trata, real e simplesmente, da nova África do Sul. É desapontador que seja classificado como um drama violento com conotações políticas", diz Tilley.
O que ele achou encorajador, no entanto, foi a ousadia da SAB em ir adiante e transmitir o filme.
Makhene considera o filme importante por outros motivos. "'The Line' interessa porque fala ao coração das pessoas –não como Mandela e De Klerk discutindo questões constitucionais".
Tradução de Paulo Migliacci

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