São Paulo, quarta-feira, 10 de agosto de 1994
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Semelhança assustadora

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO – Chega a ser assustadora a semelhança da ocupação –e ação truculenta– dos camelôs que se apossaram do centro da cidade do Rio com a dos traficantes que mandam e desmandam nas favelas.
Da mesma forma que no morro –onde a imensa maioria da população é composta de trabalhadores honestos, acuados e amedrontados pelo poder bélico do tráfico–, nas ruas dominadas pela máfia dos camelôs imperam os métodos violentos de intimidação e imposição do poder paralelo.
Está mais que provado que a situação de conflito existente nas favelas do Rio é consequência direta da ausência do poder público. A população favelada não tem ao seu lado o médico, a assistente social, a polícia comunitária, o juizado de pequenas causa. O espaço fica, portanto, vago e disponível para o traficante.
Da mesma forma, as ruas do centro –e os comerciantes, que pagam imposto e têm suas lojas ali estabelecidas– não contam com o apoio da fiscalização e desconhecem a proteção policial efetiva.
Mais uma vez o espaço fica vago e disponível, agora para o contrabandista de muamba "importada", o passador de material falsificado –relógios, eletrodomésticos– ou então de mercadorias roubadas.
Pelo menos a metade dos camelôs –evidentemente os mais interessados em tumultuar qualquer tentativa de disciplinar este comércio– é formada por "laranjas", prepostos de "comerciantes" ou "atacadistas", que fornecem a quinquilharia e garantem seus pontos à base da truculência e intimidação.
Isso não é novidade, a polícia sabe. Assim como sabe onde estão as bocas de fornecimento de drogas nos morros e quem são seus donos.
Aí o cidadão comum pergunta: e por que tudo continua igual?
Com a palavra as chamadas autoridades.
Parece piada, mas não é: finalmente, depois de nada menos que 11 anos, o Rio de Janeiro voltará a ter listas telefônicas. Só mesmo a paciência e criatividade do carioca permitiu que a segunda cidade do país conseguisse sobreviver esse tempo todo sem a relação dos telefones de seus moradores.

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