São Paulo, quarta-feira, 17 de agosto de 1994
Próximo Texto | Índice

As águas do São Francisco

O ambicioso projeto de transposição das águas do rio São Francisco recentemente anunciado pelo governo federal é altamente polêmico, como mostram os artigos da página de Tendências/Debates de hoje. A iniciativa previa inicialmente gastos da ordem de US$ 2 bilhões para desviar parte da água do São Francisco, utilizando-a para perenizar rios temporários de alguns Estados da região Nordeste. Esse projeto, como informou esta Folha, acabou sendo reduzido para US$ 600 milhões, mas mesmo em nova versão o empreendimento tem futuro incerto devido à falta de recursos e –segundo a versão oficial– ao seu possível impacto ambiental.
Envolta em dúvidas no aspecto legal –a licitação para o detalhamento do projeto original foi suspensa pela Justiça–, também no âmbito técnico a proposta vem suscitando críticas.
Mais ainda, mesmo que fosse implementado como previsto inicialmente, o projeto não teria qualquer garantia de eficácia, já que dependeria, para produzir resultados, de um programa de irrigação que exigiria ainda novos e vultosos recursos. O próprio governo, aliás, reconheceu que não haveria, nos próximos 20 anos, capacidade para utilizar toda a água que seria desviada.
O problema da seca exige sem dúvida uma abordagem mais adequada por parte das autoridades do que a que o país assistiu até aqui. Isso não significa contudo que a resposta esteja em projetos de grande envergadura. Ao contrário, é preciso antes avaliar com atenção, por exemplo, quais são as efetivas potencialidades da rede de açudes.
Inequívoca, de todo modo, é a inoportunidade de uma iniciativa faraônica num momento em que a confiança no equilíbrio das contas públicas é essencial para as perspectivas de estabilização do país.
Assim, em vez de anunciar mudanças de planos, melhor faria o Palácio do Planalto se cancelasse de vez o projeto. Seria uma forma de se mostrar afinado com a as exigências de austeridade colocadas pela conjuntura atual –e alardeadas pela própria administração federal– além de abrir espaço para se buscar, com realismo e sobriedade, a solução mais eficiente possível para um problema tão grave como o da seca.

Próximo Texto: Do caos ao paraíso?
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.