São Paulo, domingo, 21 de agosto de 1994
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Rússia tropeça rumo a capitalismo incipiente

OSCAR PILAGALLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Empresas russas encontram obstáculos intransponíveis na caminhada em direção à economia de mercado. Uma falência leva à outra, num ameaçador efeito dominó.
O exemplo mais simbólico talvez seja o da Kristall. Num país de apreciadores de vodca, nem a fabricante de uma marca popular –a Stolichnaya– resistiu. Fechou as portas há dias, sucumbindo a pesada dívida.
O caso mais grave, sem dúvida, é o da instituição financeira MMM, que deixou de pagar rendimentos prometidos de até 3.000% ao ano, dizimando a poupança de milhões de pequenos investidores.
Foi um caso de polícia. O presidente da empresa foi detido no início do mês e, embora tenha cometido todo o tipo de crime de colarinho branco, está sendo acusado apenas por evasão fiscal.
O destino da corretora e da destilaria ilustra a situação do capitalismo na Rússia, que tropeça nos primeiros passos ensaiados depois de décadas de centralização da atividade e do planejamento econômico na mão do Estado soviético.
A economia vive crise aguda de liquidez. Compradores não pagam fornecedores. Trabalhadores estão com os salários atrasados. As dívidas das empresas se avolumam.
O presidente Boris Ieltsin está dividido. Até recentemente foi firme ao limitar o crédito, cumprindo o acordo com o FMI assinado em meados do primeiro semestre.
Trata-se da receita clássica: aperto na expansão monetária e controle nos gastos do governo para combater a inflação.
Na semana passada, no entanto, Ieltsin deu uma guinada e acabou soltando uma linha de crédito subsidiada de US$ 2 bilhões para tentar salvar a indústria.
Economistas do FMI ouvidos pelo }Financial Times não gostaram da iniciativa. Eles desconfiam que o decreto pode ser a primeira de uma série de decisões com o mesmo objetivo.
Não se conhece a extensão real das dívidas das empresas russas. Os cálculos variam de um mínimo de US$ 15 bilhões, segundo analistas independentes, a pouco mais de US$ 50 bilhões, segundo um relatório do governo.
Como a ajuda oficial não é suficiente, cresce a tendência de empréstimos entre empresas, o que coloca em risco o sistema financeiro do país.
A crise se alastra em meio a uma recessão profunda e a uma inflação que até há pouco tempo faria do rublo um }sparring respeitável para o antigo cruzeiro real.
Este ano a previsão oficial é de que o PIB (Produto Interno Bruto) caia cerca de 10%. Esta é, em comparação, uma boa notícia. No ano passado, a queda foi de 12%. E no anterior, de 19%.
A inflação é declinante, embora a tendência não esteja mais assegurada depois das recentes medidas de Ieltsin protegendo a indústria do país.
A queda do PIB, vertiginosa como é, ainda mascara a situação da indústria. A produção industrial deve declinar entre 35% e 38% este ano, segundo previsão do Banco Central da Rússia.
O desempenho negativo apenas não influi mais no PIB devido ao peso cada vez menor da indústria na economia do país.

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