São Paulo, domingo, 21 de agosto de 1994
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Sem pára-quedas

Apenas entre 1990 e 1992 o mercado mundial de aviação perdeu US$ 11,5 bilhões. Foram demitidos 80 mil funcionários nas 221 empresas ligadas à International Air Transport Association (Iata). Alguns casos tornaram-se emblemáticos, como a quebra da Pan Am.
No Brasil, entretanto, ainda há quem sonhe com a perpetuação do modelo de desenvolvimento econômico à custa de privilégios –naturalmente pagos pelos contribuintes. Defendem por exemplo, contra a realidade, medidas de socorro a empresas aéreas que, como a maioria das congêneres internacionais, passam por uma crise estrutural.
Essas vozes erguem-se numa seara onde mais valeria reconhecer o primado da razão. Ninguém menos que Herbert de Souza, o Betinho da solidariedade com os famintos e miseráveis, veio a público solicitar ao BNDES não reforço na luta contra a fome, mas um módico socorro de US$ 270 mihões para a Varig. No mesmo tom Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho que agora preside a CUT, foi ao Planalto solicitar a criação de uma câmara setorial da aviação para evitar demissões no setor.
Mais difícil, ainda que urgente, é abrir os olhos e enfrentar a realidade. Atitude a que a própria Varig, aliás, rendeu-se antes de seus defensores, abrindo-se a uma aliança com seus credores mais importantes. Eles devem passar a compartilhar a direção da empresa. Espera-se que para reestruturá-la e não para sonhar com soluções românticas financiadas pelo Tesouro.
Já se discutiu à exaustão o caráter corporativista das câmaras setoriais. Só piora as coisas solicitá-las em nome de um empreguismo e de notórios privilégios, como os que acabaram por transformar a Varig num caso esdrúxulo de empresa privada com cara de estatal.
A tendência internacional é de formação de alianças e parcerias, quando não ocorre a associação direta entre empresas conscientes da redução do espaço aéreo disponível. O compartilhamento de instalações e infra-estrutura, o enxugamento de rotas e outras estratégias de redução de custos têm andado lado a lado com a redução de tarifas e lançamento de promoções. Mas no Brasil, não. Há quem pretenda para a Vasp, Transbrasil e Varig o privilégio da sobrevivência à custa de socorro oficial.
É evidente que ninguém deseja uma quebradeira como solução. As câmaras setoriais, se se controlarem o corporativismo e as várias formas de renúncia fiscal, podem desempenhar um papel certamente mais saudável do que o assumido até agora pelo Departamento de Aviação Civil (DAC) –o qual, supostamente, deveria ter permanecido atento ao setor há muito.
A aviação civil precisa de um novo desenho institucional. Mas é fundamental constatar, apesar da dor, que não há pára-quedas suficientes para todos.

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