São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994 |
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As Portas da Percepção
MOACYR SCLIAR – Eu acho uma injustiça o que fizeram com esta psicóloga do Rio– disse ela, tomando um gole de cerveja.Não contestei: é minha amiga, e é psicanalista, filiada a alguma obscura corrente francesa. – O que ela queria –continuou– era ultrapassar aquilo que Aldous Huxley chamou de "as portas da percepção". Por quê não? Muitos o fizeram, escritores, antropólogos, artistas. Foram além do mundo habitual em que vivemos, penetraram em outra dimensão de nossa mente. Uma vivência transcendental. Se é feita com ajuda de LSD ou não, que importância tem? Eu ia lembrar que a notícia falava em venda de LSD, mas resolvi ficar calado, mesmo porque ela se mostrava disposta a elaborar o assunto. – O LSD é uma coisa fantástica. Falo por experiência própria: já usei. Mas não foi aqui no Brasil, não, foi na França. – E que tal? – Notável. Na primeira vez eu estava no meio de uma névoa multicolorida e escutava harmonias deliciosas; mas aí tive medo e recuei. Já na segunda vez, fui mais audaz: entrei no meio da névoa, andei, andei, e de repente vi uma porta. – A porta da percepção? – Isto mesmo. Viu, como você está aprendendo? Eu enxerguei a porta, mas não tive coragem de abri-la. Esta coragem só me veio na terceira vez. No meio da visão, fui lá, e num gesto ousado, abri a porta. – E aí? O que é que você encontrou? – Um policial –disse ela, aborrecida. Um policial francês que me autuou pelo uso de LSD. Não era visão, era realidade. Mas você sabe por que aconteceu isto? – Não. Por quê? – Porque era LSD brasileiro, LSD que eu trouxe do Rio. E esta foi a grande lição que eu aprendi: nunca use LSD brasileiro. Quando você ultrapassar as portas da percepção, vai se incomodar na certa. Texto Anterior: Policiais vivem inferno em filme Próximo Texto: Unicamp prevê 'calote' em contas de água e luz Índice |
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