São Paulo, segunda-feira, 29 de agosto de 1994
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'Ninguém conhece o tamanho dos subsídios'

VINICIUS TORRES FREIRE
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo calcula em cerca de US$ 1,1 bilhão a renúncia fiscal da União na Zona Franca de Manaus. A Superintendência da Zona Franca de Manaus diz que os incentivos não passam de metade disso.
O advogado tributarista Geraldo Ataliba contesta os dois: "É tudo chute. A burocracia para calcular o total dos incentivos é infernal. Ninguém conhece o tamanho dos subsídios."
Ataliba, professor titular de instituições de direito na USP e de direito tributário na PUC-SP, diz que "nem na Itália, que inspirou o modelo brasileiro de incentivos, se chega a uma conta confiável".
O diagnóstico do tributarista é semelhante ao da Comissão do Congresso que, no final de 93, concluiu um estudo sobre as desigualdades inter-regionais no país. A comissão levantou dados sobre a transferência de recursos da União para Estados e incentivos fiscais.
Outros inconvenientes das isenções tributárias, segundo Ataliba, se devem ao fato de elas serem "secretas, ensejarem arbítrio, manipulação e fraudes".
O tributarista sugere, em substituição ao modelo, os subsídios em dinheiro. "Eles seriam facilmente contabilizáveis e constariam do Orçamento. O retorno e a aplicação desses subsídios poderiam ser controlados pelas comunidades, o que evitaria fraudes", diz.
O diretor da Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica, Cláudio Vita, considera que a política de incentivos pode ser eficiente: "O problema é que não há política industrial no país, o que faz com que se concedam benefícios de maneira descontrolada e sem atender prioridades nacionais."
Segundo ele, para se tocar um projeto na Zona Franca de Manaus é preciso passar por cinco ministérios. "A burocracia é imensa, mas descoordenada, e não estabelece as regras e quais setores devem ser protegidos." Vita lembra que só se pode falar em renúncia fiscal depois que há produção. "Ninguém reclamaria dos incentivos se não houvesse investimento e criação de empregos etc." Entre 1970 e 1990, a região Norte cresceu sete pontos mais que o total do país. A Zona Franca foi criada em 1967.
Também para a pesquisadora Aspásia Camargo, presidente do Ipea, a transparência é fundamental para que a sociedade possa fazer um "pacto negociado e racional" através do Orçamento. Aspásia deve publicar até o fim do ano um livro sobre o assunto –"O Brasil Gigante -os riscos do federalismo incompleto".
"É preciso que todos os recursos constem de maneira transparente no Orçamento. A partir daí a sociedade pode discriminar prioridades e passar a evitar transferências fragmentadas e clientelísticas de dinheiro público", diz Aspásia.
Segundo ela, a demonstração das "torneiras" do Estado é a base sobre a qual pode se estabelecer um novo pacto federativo –o acordo pelo qual os Estados acertariam a divisão das receitas estatais, as prioridades de investimento, enfim, o planejamento do desenvolvimento nacional.
A guerra pelos recursos da União não deixa de ocorrer em nível interestadual. Nos últimos dois anos, tem-se tornado mais acirrada a disputa por investimentos privados através de benefícios fiscais (ICMS) e financeiros concedidos pelos Estados. Não há estimativas de quanto se deixa de arrecadar com essa "guerra fiscal", considerada inconstitucional pelo tributarista Geraldo Ataliba.

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