São Paulo, domingo, 4 de setembro de 1994
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Ataques de muçulmanos radicais não têm objetivo, diz historiador

DAVID COHEN
EDITOR-ADJUNTO DE EXTERIOR

Terror de muçulmanos radicais não tem objetivo, diz historiador
"O fanatismo consiste em redobrar seus esforços quando você já esqueceu seu objetivo", disse o filósofo espanhol George Santayana, em 1905.
A frase citada pelo historiador israelense Emmanuel Sivan, 57, caracteriza a atual onda de atentados terroristas, segundo ele.
Sivan, especialista em assuntos islâmicos, dirigiu o departamento de planejamento de política internacional de Israel de 1984 a 1986, sob o governo Shimon Peres.
Segundo ele, o que há de comum entre os atentados de Buenos Aires, Londres e World Trade Center, assassinatos de franceses na Argélia ou a perseguição ao escritor Salman Rushdie é que todos são atos sem objetivo prático.
Não se trata, como na época dos grupos guerrilheiros marxistas, de tentar depor um regime, mas de retaliar contra o que radicais muçulmanos percebem como aliados de seus inimigos (principalmente os governos "corruptos" de países islâmicos).
"É como uma criança que briga com outra e vai descontar no irmão mais novo de seu inimigo".
A seguir, os principais tópicos de entrevista que Sivan concedeu em sua passagem por São Paulo, durante uma viagem na semana passada pelo Chile, Brasil e Argentina:
BOMBA EM BUENOS AIRES
O atentado de 18 de julho contra organizações judaicas em Buenos Aires (com 96 mortos) foi planejado pelo grupo xiita libanês Hizbollah, segundo Sivan. Os radicais islâmicos teriam tido ajuda do Irã: "O Hizbollah não tem estrutura internacional e precisa de favores para uma operação desse tipo."
O motivo do Hizbollah, segundo o historiador, seria dar moral às suas tropas, depois de seguidos ataques israelenses a bases guerrilheiras no sul do Líbano.
POSSÍVEIS ALVOS
Qualquer país, especialmente se a segurança não for muito boa (caso da Argentina). Sivan citou como exemplo a escritora Taslima Nasrim, asilada na Suécia depois de ter sido ameaçada de morte em Bangladesh por ter dito que a lei islâmica precisava de reforma.
Segundo ele, a Suécia "importou" um problema de segurança. Seus agentes investigam a comunidade bengalesa dos países nórdicos porque, }entre os milhares de muçulmanos, basta um louco para fazer um atentado.
COMBATE AO TERROR
Além, é claro, dos métodos normais de combate policial, é necessária uma estratégia "positiva" –abertura política e, principalmente, econômica. Segundo Sivan, deu certo na Tunísia e 50% certo no Egito.
Na Argélia, "fracassou porque o regime militar não fez o suficiente. Dou um exemplo. A Michelin queria abrir uma fábrica na Argélia para exportar pneus para todo o norte da África. Não conseguiu a licença porque dois coronéis reformados detinham o monopólio de importação de pneus. E é claro que o Exército não agiria contra velhos camaradas..."
PROCESSO DE PAZ
Paradoxalmente, o avanço das negociações entre árabes e isralenses traz mais perigo de atos terroristas, pelos radicais (muçulmanos e judeus) que seguem a lógica do fanatismo descrita por Santayana.
Mas "não está escrito no Corão que eles têm que ser extremistas. Essa é a estratégia no momento. Eles acreditam que podem explodir o processo de paz. Enquanto eles não perderem a esperança, vão continuar com ataques."
SÍRIA x ISRAEL
"O que se passa na cabeça de um homem, (o presidente sírio, Hafez al) Assad, ninguém sabe. Mas as publicações internas do Exército têm preparado o país para a possibilidade da paz."
Antes de intervir no Líbano, em 75-76, Assad passou nove meses numa campanha de propaganda interna, diz Sivan. Há três anos, a inteligência israelense detectou o mesmo processo, desta vez para negociar com Israel.
RABIN x PERES
O premiê Yitzhak Rabin e o chanceler Shimon Peres têm uma velha disputa de vaidades. Cada um já foi premiê de Israel duas vezes. Mas hoje formam uma "boa dupla", segundo Sivan: "Peres rompe e Rabin puxa o freio".
"São como cavalos velhos. Mas dependem um do outro. Não acho que briguem hoje em dia. Quem briga são os assessores."

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