São Paulo, domingo, 4 de setembro de 1994
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Entre o bicho e a droga

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

De acordo com a lei japonesa, nenhuma pessoa pode entrar naquele país se tiver algum antecedente criminal em qualquer parte do mundo ou tiver afrontado os controles de drogas, narcóticos e estimulantes.
Diego Maradona foi impedido de visitar o Japão no ano passado pelo fato de ter sido declarado culpado na Itália pelo uso de drogas e preso na Argentina por atirar e ferir cinco jornalistas. Apesar de seu prestígio, não houve contemplação. Ficou de fora.
Na ocasião, a imprensa criticou muito aquele "excesso de rigidez". Mas acabo de ler um artigo no qual os próprios jornalistas reconhecem que o exercício rigoroso do controle da droga e do crime é a principal razão de o Japão estar livre desses graves problemas (ver Akihiro Otani, "Keeping Maradona out was a Right Thing to Do". "Japan Update", agosto de 1994).
O Senado americano aprovou, na semana passada, um projeto de lei que amplia o número de crimes sujeitos à pena de morte, proíbe a comercialização de vários tipos de armas e estabelece a responsabilidade civil a partir dos 13 anos de idade. Foi um considerável "endurecimento" na legislação em vigor.
O Senado do Brasil igualmente aprovou um oportuno projeto que torna inafiançáveis os crimes planejados ou praticados por grupos de extermínio. Foi também um bom avanço.
Nesses três países há diferenças interessantes. O Brasil é a nação que tem as penas mais brandas e o cumprimento mais frouxo. O Japão está no outro extremo: tem a legislação mais rigorosa e a implementação mais eficiente. Os Estados Unidos estão no meio: implementam com rigor mas, até então, tinham uma legislação relativamente frouxa, que permitia a qualquer pessoa comprar armas de grande periculosidade na loja da esquina. O projeto aprovado visa acabar com essa moleza.
É certo que o analfabetismo, o desemprego, a miséria e a desigualdade têm muito a ver com a droga e com o crime. Mas o rigor da lei, tanto na prevenção quanto na correção, é absolutamente fundamental para conter essas epidemias sociais.
No Brasil, os que são do ramo sabem que um infrator tem pouca chance de ser detido num eventual delito. Se ocorrer o delito, ele tem uma baixa probabilidade de ser indiciado. Se indiciado, dificilmente será denunciado. Entre os denunciados, poucos são condenados. E, entre os condenados, raros ficam presos. Para a maioria, faltam cadeias; e para a minoria sobram habeas-corpus que põem em liberdade os meliantes mais contumazes, como ocorreu com o caso do famoso bicheiro em São Paulo, ainda esta semana.
O crime, a violência e a droga são determinados por uma combinação multiplicativa daquelas irrisórias probabilidades. O resultado final é uma possibilidade de punição tão pequena que se transforma num verdadeiro convite ao delito. Bem diferente é a situação do Japão, onde nem um ídolo mundial, como o Maradona, consegue demover as autoridades no cumprimento da lei existente. Ali, o crime não compensa e, aparentemente, não dá voto.

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