São Paulo, sábado, 10 de setembro de 1994
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Duro, mas com ternura

A escolha de Ciro Gomes para ministro da Fazenda teve impacto positivo nos mercados e na opinião pública. Cumpriu um papel duplo: o de assegurar continuidade ao Plano Real e o de criar um fato político capaz de superar a crise aberta pelo episódio Ricupero. Ciro Gomes entende que a continuidade do programa de estabilização requer habilidades políticas mais que técnicas.
No momento, a habilidade política praticamente se confunde com o tino de comunicador. Antes mesmo de se propor ou executar novas medidas de política econômica há um trabalho enorme, e fundamental em se tratando de reconstrução da moeda, que é cultivar a confiança da sociedade na estabilidade.
É fácil subestimar esse desafio. Geralmente o sucesso de um plano é avaliado pelos economistas em termos de consistência macroeconômica, fundamento fiscal e outros critérios estritamente técnicos. Entretanto, a avaliação técnica é necessária mas não suficiente.
Se hoje a percepção de acerto da política econômica é majoritária, de outro lado a batalha das expectativas mal começou. Ela é travada no dia-a-dia e exige um corpo-a-corpo com a opinião pública, um trabalho que não é apenas de convencimento, mas beira a sedução. A escolha de Ciro Gomes por certo atende a uma lógica comunicativa e não apenas instrumental. O cargo pede, mais que nunca, alguém que possa ser entendido pelos cidadãos.
O atual momento é de transição para um regime de estabilidade monetária, mas que ainda convive com resquícios do regime anterior: do resíduo estatístico, que contamina os índices, à cultura da indexação automática, presente ainda em inúmeras reivindicações.
Nesse ambiente, a política econômica deve ter ao mesmo tempo o tom de uma hábil negociação e a energia de quem está disposto às mais duras batalhas para preservar o que já se conquistou.
O teste definitivo do novo ministro estará portanto na sua capacidade de manter e até ampliar a confiança nas novas regras, combinando negociação e iniciativa. O desafio é enorme e o resultado que se espera, na economia, é uma revolução cultural. Do ministro se espera que seja duro, mas para merecer uma confiança ampla, não pode perder a ternura jamais.

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