São Paulo, sexta-feira, 16 de setembro de 1994
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Filme mostra Eliot como pateta machista

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Filme: Tom & Viv
Direção: Brian Gilbert
Estréia: a partir de hoje na Sala Aleijadinho do cine Belas Artes

Primeiro, Camille Claudel; depois, Zelda Fitzgerald; agora, Vivienne Eliot. Três mulheres geniais e três mulheres de gênios. O cinema nunca teve vítima mais fácil para explorar.
No filme de Bruno Nuytten, Claudel era escultura tão talentosa ou mais que seu amásio Rodin, mas, como ele não largou a mulher por ela, enlouqueceu. Numa série de TV americana, Zelda já era louquinha, mas o escritor Scott Fitzgerald não soube ajudá-la a desenvolver o talento literário.
No filme de Brian Gilbert que estréia hoje, "Tom & Viv", o poeta americano T.S. Eliot (1888-1956) é um pateta (Willem Dafoe) que, para ser aceito socialmente, liquida a relação com a primeira mulher (Miranda Richardson), uma contestadora contumaz da hipocrisia social anglo-saxã.
A questão não é fazer só uma crítica ao argumento do filme, afinal arte não é argumentação; mas o filme não é nada senão um argumento. Um argumento estulto exposto de maneira tosca.
O poeta de "The Waste Land", entre outras obras-primas, foi sim um sujeito (como se diz mesmo?) "careta", que se empregou num banco já que a poesia não lhe dava dinheiro. E daí? Como o brasileiro Machado de Assis, mudou mais o mundo que tantos "rebeldes".
No filme, sua fama cresce de maneira inversamente proporcional à derrocada de Vivienne. Ou melhor, cresce à custa dela. Justo ela que, como mostra o filme, o ajudou tanto a confeccionar versos –fato que o perverso Eliot omitia aos amigos intelectuais.
A contraposição absurda guia todo o roteiro. E se vale de acusações as mais equivocadas e desonestas. Um exemplo só, entre tantos. Cita-se no filme uma frase famosa de Eliot: "A poesia não é expressão da emoção, mas fuga da emoção". Como esse Eliot era desalmado. Ocorre que a frase tem um complemento que não é citado: "Mas só sabe o que é fuga da emoção quem sabe o que é emoção". Sutil demais para uma cultura que divide as pessoas entre "caretas" e "modernas".

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